As Pessoas Invisíveis, de José Carlos Barros
Os prémios Leya ainda hoje, e apesar da sua redução monetária, continuam a ser o prémio literário mais importante entre nós, no que a textos inéditos diz respeito.
Nos 10/12 anos da sua existência, o prémio não só revelou novos autores, Afonso Reis Cabral, Gabriela Ruivo Trindade, João Ricardo Pedro e Nuno Camarneiro, como trouxe à literatura portuguesa títulos de grande qualidade que, de outra forma, teriam muita dificuldade em chegar ao público. Títulos como esse notabilíssimo Torto Arado, de Itamar Vieira Júnior, ou O Olho de Hertzog, de João Paulo Borges Coelho, não teriam alcançado entre nós a visibilidade e o êxito que tiveram se não fosse este prémio.
Mas nem tudo tem corrido bem ao júri deste prémio o qual, em alguns casos, tem falhado de forma chocante na análise de alguns textos que lhe chegam às mãos. Um dos falhanços clamorosos do júri, presidido pelo poeta Manuel Alegre, tem a ver com romance de Ana Margarida de Carvalho, Que Importa a Fúria do Mar, um dos mais importantes textos da nossa actual literatura e Grande Prémio da APE, que não mereceu do júri Leya mais que uma selecção nos cinco finalistas, acabando por ser publicado só um ano depois.
O romance vencedor do Leya em 2021, As Pessoas Invisíveis, de José Carlos Barros, é um texto interessante e particularmente bem escrito, uma viagem pelo país salazarento, desde os anos da 2ª. Guerra Mundial, até essa vergonha escondida que foi a inventona de Batepá, ou de Mata, pá!, na expressão do escritor Sum Marky, o genocídio de várias centenas de naturais de S. Tomé, que se negaram a ser escravos do poder despótico do coronel Gorgulho, um capo do fascismo luso tornado por Salazar governador do arquipélago de S. Tomé e Príncipe, nos anos 1950.
A personagem central do romance, Xavier, que tem poderes demiúrgicos, ou se convence de os ter, percorre uma vasta geografia do país e colónias, a começar no volfrâmio de Trás-os-Montes, vendido a alemães e ingleses dado que Salazar era, como a história conta, “neutral”. Sabendo-se depois, por um arguto alemão de nome Klaus, que por aquelas paragens coabitava o volfrâmio e um mais rentável minério: ouro.
Xavier, que não passa de um sevandija menor, enredado nas suas tropelias de curandeiro, é preso, foge e desembarca em S. Tomé onde se tornará homem de mão de Gorgulho.
O júri do Prémio Leya salientou na escrita do romance de José Carlos Barros, arquitecto, nascido em Boticas e com obra poética e ficcional publicada, o «trabalho da linguagem, o domínio de uma oralidade telúrica a contrastar com a riqueza do vocabulário». Acrescente-se uma estória que fala da nossa história de modo assertivo, lúcido e crítico. Que mais exigir?
As Pessoas Invisíveis, de José Carlos Barros – Prémio Leya 2021.