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Covid-19 – Intervenção d’A Voz do Operário

A situação económica, social e política decorrente da pandemia do Covid-19 colocam à Voz do Operário exigências de intervenção que merecem ser sistematizadas do ponto de vista dos valores e objectivos da instituição para que se perceba melhor o já feito, o que está em curso e o futuro próximo.

1. Garantir o ensino, alargar os apoios sociais

Quem usufrui dos serviços d’A Voz não pode ficar desamparado quando mais precisa. Quando em meados de Março, o Governo decidiu encerrar as escolas, não estava clara a duração de tal decisão nem do impacto que viria a ter na vida das crianças e das suas famílias. Mas a Voz não hesitou. Num esforço tremendo de professores, auxiliares de acção educativa, psicólogos, administrativos e outros profissionais — em pouco mais de um fim de semana — colocou em funcionamento um “conjunto de estratégias” procurando “desde a primeira hora garantir que os nossos alunos, nos vários níveis de ensino, não ficassem desacompanhados”. Atente-se, nunca buscou um sistema de ensino à distância, mas sim, um “conjunto de estratégias tendo em vista o apoio às famílias e o acompanhamento dos alunos”.

A exigência foi, e continua a ser, grande, mas o permanente sentido de aperfeiçoamento, a reflexão e o contributo dos profissionais, dos pais e sobretudo das crianças têm permitido ir melhorando e adaptando o processo para que, a cada momento, melhor se responda às necessidades gerais e individuais das crianças. Entretanto, A Voz do Operário é bem mais do que uma escola. Aliás, talvez seja justo dizer, que é a escola que é porque é mais do que uma escola.

No plano social manteve-se o apoio domiciliário no na Graça/S. Vicente e freguesias limítrofes e no Laranjeiro, alargou-se o refeitório social para quase 100 refeições diárias e garantiram-se as refeições aos utentes do Centro de Convívio que passaram a estar em suas casas. Simultaneamente, foi-se respondendo a novas necessidades como a disponibilidade para, no Lavradio, assegurar a creche dos filhos dos trabalhadores das profissões consideradas essenciais ou a produção de equipamentos de protecção individual para hospitais, em cooperação com a Associação dos Comerciantes do Mercado de Santa Clara.

2. Assegurar o caráter solidário da instituição e garantir os direitos e os rendimentos dos trabalhadores

A Voz do Operário é uma Instituição Particular de Solidariedade Social de matriz operária e de classe. Os desenvolvimentos económicos e sociais e as opções políticas que fragilizam os trabalhadores e vastos sectores como os pequenos empresários, os artistas e os trabalhadores independentes levaram a que se avaliasse a real situação destes e se procurasse ajustar vários aspectos, desde logo a do pagamento das mensalidades da escola. Em menos de dois meses foi possível, no seguimento de uma gestão rigorosa, criar as condições para uma redução muito significativa nas mensalidades pagas pelas famílias que viram reduzidos os seus rendimentos, enquanto se apela aos que mantêm a capacidade financeira para continuar a suportar solidariamente a totalidade da prestação. Ainda sobre esta matéria importa destacar que, como se afirma num comunicado aos pais “nunca nenhuma criança deixou de frequentar A Voz do Operário por dificuldades financeiras da sua família e certamente não será agora que tal vai acontecer”.

Por outro lado, a solidariedade não pode ser construída em contraponto aos direitos e rendimentos dos trabalhadores. O compromisso d’A Voz do Operário com os seus trabalhadores é correspondente ao que estes têm para com a instituição. É fundamental respeitar os seus direitos e salvaguardar os seus rendimentos. Foram gerações de trabalhadores dedicados que asseguraram parte substancial da iniciativa d’A Voz em quase século e meio; são os trabalhadores que hoje — em condições muito especiais — asseguram o funcionamento de um conjunto significativo de iniciativas; serão os trabalhadores que a assegurarão num futuro, que se quer muito próximo, a plena actividade da instituição.

3. Salvaguardar o presente e o futuro da instituição

A Voz do Operário é uma grande instituição e uma referência no plano nacional. Ao longo dos anos passou por períodos diversos, alguns deles marcados por grandes dificuldades de gestão e financeiras, não obstante sem- pre encontrou resposta na abnegação dos dirigentes, na dedicação dos trabalhadores, na força dos associados, na grandeza dos seus objectivos.

A Voz concretiza uma ampla actividade no ensino, com mais de 1200 alunos, no apoio domiciliário, na cantina social, no balneário público, no centro de convívio e num amplo leque de iniciativas associativas, culturais e editoriais. São mais de 200 trabalhadores e largas dezenas de associados e amigos d’A Voz que dão corpo a todo este magnífico movimento.

Hoje, com um orçamento anual superior a cinco milhões de euros (e ciente das responsabilidades que isso implica para com os utentes e trabalhadores), as exigências de gestão são muito significativas. Para lá do rigor necessário na gestão dos recursos e na prestação de contas, requer-se uma imaginação constante para desenvolver iniciativas que permitam gerar mais e diversificadas receitas para fazer face às necessidades crescentes. A título de exemplo refira-se que só para as escolas, A Voz tem de gerar anualmente mais de 55 mil euros para equilibrar as contas. A alternativa a este cenário seria sobrecarregar as famílias, sobretudo as de menores recursos.

Neste quadro de confinamento torna-se mais complexo gerar receitas em actividades como o aluguer de espaços e a realização de iniciativas. Assim, é ainda mais premente que, por um lado, as instituições que estão em dívida para com A Voz, como é o caso da Câmara Municipal de Lisboa em mais de 200 mil euros, agilizem os respectivos pagamentos e, por outro lado, o Governo tome medidas urgentes e excecionais que salvaguardem a situação financeira das IPSS e apoiem as famílias.

É, portanto, na encruzilhada destes três fatores: garantir a sua acção fundamental; ser solidária e defender os trabalhadores; gerir com rigor e reivindicar o que lhe é devido , que assentam os pilares da acção d’A Voz. Foi assim que construiu a sua História, será assim que marcará o seu futuro.

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