Neo-realismo – Uma Poética do Testemunho, de Manuel Gusmão

Neo-realismo – Uma Poética do Testemunho, de Manuel Gusmão

Poeta dos dias levantados e límpidos de Abril, ensaísta notável, estudioso arguto das obras dos nossos mais importantes escritores, de Carlos de Oliveira a Redol, de Urbano a Manuel Tiago/Álvaro Cunhal, Manuel Gusmão é, nos tempos regressivos que vivemos, uma voz lúcida e corajosa a separar trigo e joio, a denunciar embustes e penachos sem chão. 

Num tempo em que a actual literatura portuguesa parece ter perdido a tramontana e se deixa embalar (apesar, convenhamos, de alguns jovens autores se revelarem singulares e expressivas vozes) pelos cantos de Inverno e sujeição que sopram de vários quadrantes, os ensaios de Gusmão, o seu modo analítico seguro e justo, que reside no didactismo, na forma como denuncia os atropelos à dignidade e à lisura, perspicaz de agudeza dialéctica, recolhendo o que nos textos é húmus e essência, e nesse modo único como  lê as obras dos autores que ergueram o mais substantivo património da nossa criação literária, são incontornáveis para o entendimento deste período.

Essa agudeza analítica, esse modo didáctico de no-lo dar a ver um texto, está presente, com rigorosa assertividade, no seu mais recente livro de ensaios, todo ele dedicado a livros e autores que realizaram o mais duradouro e fecundo movimento literário do século XX: Neo-Realismo, Uma Poética do Testemunho – Alguns Exercícios de releitura. 

Nestes ensaios, de onde a linguagem academizante está ausente, Gusmão regressa à análise de textos de Redol (Gaibéus); Soeiro (Esteiros e Engrenagem); M. da Fonseca e a sua “Invenção do mito literário alentejano”; Mário Dionísio e Joaquim Namorado, sobre  intertextualidade e voz própria; Cunhal, o discurso clandestino e o elogio da coragem; Carlos de Oliveira, uma poética do testemunho, constituindo-se este texto mais uma brilhante incursão do autor sobre o universo poético de Oliveira; Dionísio e Urbano.

Diz-nos Gusmão no texto introdutório deste obra: Estes jovens ardiam na tensão de unirem os seus ideais revolucionários em tempos de escuridão, a sua dedicação a um povo perante o qual se sentiam como representantes responsáveis e os seus projectos de emancipação cultural, a sua vontade de criarem beleza e de a partilharem como quem partilha o pão, a liberdade, o conhecimento.

Uma visão político/literária de um tempo único na cultura portuguesa: com Povo dentro.

Neo-Realismo Uma Poética do Testemunho, de Manuel Gusmão – Edição Página a Página/2018

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