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Galiza contra a megafabrica portuguesa que ameça destruir todo um ecosistema

Umas das maiores multinacionais portuguesas, o grupo Altri, tem sido alvo do maior protesto social dos últimos 20 anos na Galiza. A sua intenção de instalar naquele território uma fábrica de produção de celulose solúvel e fibra têxtil vegetal espoletou a revolta popular que conseguiu unir todos os partidos de esquerda, associações e movimentos de moradores e ecologistas do território contra a sua construção.

Fotografia: Galiza Livre

A área escolhida pela Altri para instalar o empreendimento encontra-se em plena Rede Natura 2000 e ficará junto da Zona Especial de Conservação (ZEC) da Serra do Careón. A sua construção terá um impacto ambiental significativo na região, incluindo o consumo massivo de recursos naturais e emissão de poluentes que afetarão direta e negativamente a flora e fauna locais, algumas das quais endémicas e em risco de extinção. Além disso, terá um impacto bastante negativo na pecuária e na agricultura da zona.

A Fábrica da Altri irá consumir 46 milhões de litros de água diários durante 75 anos

Apesar de ser vendido pelos meios de comunicação ligados ao governo PP Galego como um projeto bio e sustentável, a realidade é bem diferente. Este mega projeto irá ocupar uma área equivalente a 500 campos de futebol (3,6 milhões de metros quadrados), vai expropriar mais de 800 terrenos de pequenos proprietários e está programada para transformar até 1,2 milhões de metros cúbicos de madeira de eucalipto por ano – o que irá provocar o aumento do monocultivo de eucaliptos na Galiza e até em Portugal.

Para produzir 400 mil toneladas de celulose solúvel por ano, e 200 mil toneladas de Lyocell (fibra têxtil vegetal), a fábrica da Altri irá necessitar de 46 milhões de litros de água por dia extraídos do rio Ulla, quantidade equivalente ao consumo de toda a província de Lugo (350 mil habitantes). Despejará também cerca de 30 milhões de litros de águas residuais por dia, por um período de 75 anos. O caudal mínimo necessário para diluir a contaminação da fábrica de celulose é de 1,67 metros cúbicos por segundo. Não se atinge esse número desde 2010.

Outro problema é que quando a água é devolvida ao rio vem a uma temperatura de 27ºC, ou seja, irá criar uma nuvem de vapor que vai fazer com que muitos elementos químicos fiquem em suspensão. Desta maneira, vários hectares vão ficar improdutivos e contaminados por causa das chamadas chuvas ácidas.

Todas estas águas contaminadas vão desaguar no rio Ulla, que abastece cerca de 100 mil pessoas. Por sua vez, desembocam no estuário de Arousa – o mais produtivo do Estado espanhol – colocando assim em risco cerca de 8 mil empregos diretos nas zonas rurais e no setor da pesca e do marisco.

Está também previsto que a mega fábrica da Altri irá lançar por dia para a atmosfera, através da sua chaminé de 75 metros de altura, cerca de 8,7 toneladas de óxido de enxofre, óxido de azoto, monóxido de carbono e diversas partículas de substâncias perigosas.

Os sócios da Altri provenientes das portas giratórias entre a política e as grandes empresas

Tudo começou em 2021, quando o Conselho da Junta da Galiza, então liderado por Alberto Núñez Feijóo, actual líder do Partido Popular espanhol, anunciou que a Altri iria instalar uma megafábrica que poderia empregar cerca de 2500 pessoas — hoje a Greenfiber (sócio da Altri neste projecto) admite que vão ser criados apenas 500 postos de trabalho.

Em Julho de 2023, foi aprovada uma mudança de propriedade do projecto e a empresa promotora passou a ser a subsidiária Greenfiber SL, detida pela Altri (75%) e Greenalia (25%).

A Greenalia é um dos maiores exemplos da promiscuidade entre o poder político e poder empresarial na Galiza. Por exemplo, dois ex-ministros do governo regional do Partido Popular (Xunta) fazem parte do seu conselho de administração. Integram ainda o conselho altos funcionários que trabalharam na gigante Inditex e no Nova Galicia Banco, o banco que nasceu da fusão entre Caixa Galicia e Caixanova, patrocinada por Alberto Núñez Feijóo, que absorveu 8 mil milhões de euros em dinheiros públicos e levou os seus administradores à prisão.

Altri: monocultivos e poluição

As empresas de celulose portuguesas são uma das grandes culpadas da proliferação do monocultivo do Eucalipto na Galiza – 1,5 milhões de metros cúbicos de eucalipto são exportados por ano para Portugal. A região, juntamente com o nosso país, representa um dos maiores monocultivos de eucaliptos do mundo – cerca de 409.000 hectares. A nova fábrica da Altri vai exigir o cultivo adicional de entre 80.000 e 190.000 hectares.

O Grupo Altri tem um largo historial de crimes ambientais em Portugal. A Celtejo, fábrica de celulose pertencente ao grupo – localizada em Vila Velha de Ródão -, é responsável por 90% das descargas no Tejo daquela zona. Entre 2015 e 2017 foram identificadas descargas com a presença de níveis de celulose cinco mil vezes superiores ao normal. A empresa foi declarada culpada de ter feito descargas com valores acima do normal.

Depois de várias grandes manifestações e pressão popular, foi alcançada a primeira vitória para o movimento “Altri non”. O Governo do Estado Espanhol veio anunciar, no passado dia 23 de abril, que a Altri não receberá os 30 milhões de euros que tinha solicitado ao abrigo dos fundos europeus associados à descarbonização. A multinacional portuguesa já veio dizer que irá continuar com o seu projeto e vai tentar encontrar outras maneiras de financiamento.

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