O segundo e o terceiro fim-de-semana do mês de outubro voltaram a levar à Graça, em Lisboa, e à Voz do Operário muito do que de melhor se faz no jazz em Portugal. Organizado pela produtora Clave na Mão, esta segunda edição do Festival O Jazz tem Voz! contou com a parceria d’A Voz do Operário, tal como já tinha acontecido na primeira edição, e com o apoio do Garantir Cultura e da Câmara Municipal de Lisboa.

A ideia de criar um Festival de Jazz nesta zona da cidade de Lisboa surgiu em pleno período pandémico, numa altura em que se assistia em Portugal, e um pouco por todo o mundo, a uma dramática situação para todos os que fazem da Cultura o seu trabalho. Com as agendas tomadas pela palavra “adiado” ou “cancelado”, verificando-se que muitas das vezes o adiamento significava um verdadeiro cancelamento, técnicos, músicos, actores, bailarinos viram-se de um dia para o outro sem meios para, muitas vezes, fazerem frente às despesas básicas da sua vida, e sem apoios formais e permanentes, confirmando o desrespeito a que tantas vezes se vêm votados pelo poder político.

Perante este quadro, e com o apoio do Fundo de Emergência Social da Câmara Municipal de Lisboa, a Clave na Mão apresentou um projecto de levar à Voz do Operário, parceira desde o primeiro momento, um festival de jazz que desse trabalho a técnicos e músicos, e que levasse a este lado da cidade um programa de uma área cultural que ocupa habitualmente outras geografias da capital portuguesa. Realizada a primeira edição, foi no último dia de concertos que se traçou aquele que viria a ser o programa desta segunda edição. 

Sentados no fundo da sala da Voz do Operário, com o César Cardoso Ensemble em palco, fomos atirando e devolvendo nomes, um ao outro, nomes que sonhávamos ver pisar aquele mesmo palco.

Músicos que fazem parte das nossas vidas, das nossas diferentes vivências. O primeiro foi o da OJM. “Uma Orquestra ali seria incrível”, dizíamos. “E se falássemos com a OJM e o João Paulo Esteves da Silva para nos trazerem o seu Bela Senão Sem?”. E assim foi.

Depois veio o Trio do Mário Laginha. E se era para sonhar, então teria que trazer a Maria João. E assim foi.

Para terminar, queríamos alguém que retratasse esta geração mais nova de músicos em Portugal, que tanto talento tem demonstrado. E assim se transformou o palco d’A Voz em Duplex, com o saxofone de Ricardo Toscano e o acordeão de João Barradas.

Ficava completa a programação para os 3 dias centrais de Festival. Meses depois recebemos a resposta positiva à candidatura ao apoio do Garantir Cultura e percebemos que havia margem para fazer mais, apoiar mais músicos e técnicos, alargar a programação e tornar o Festival mais inclusivo e acessível.

Levámos então O Jazz tem Voz! para a rua, ao encontro das pessoas do Bairro da Graça e de quem mais se quisesse juntar, e voltámos ao Largo de Santa Marinha para dois concertos gratuitos, ao ar livre, no fim de semana que antecedeu os 3 dias de Festival no Salão d’A Voz do Operário.

Não podíamos deixar de chamar para este palco o disco Two Maybe More, do Pedro Moreira Sax Ensemble, com os seus 8 saxofones, bateria e contrabaixo, que teve edição este ano pela editora Robalo, tal como não podíamos ficar indiferentes ao último disco do trio da Paula Sousa, Beatriz Nunes e André Rosinha, que conta com o belo e tão actual título À Espera do Futuro, esse que todos esperávamos no último ano e meio.

Marca da Clave na Mão, que tem a criação de públicos como ponto central, não resistimos também a “pincelar” as manhãs do fim de semana nuclear do Festival com uma programação direccionada para o público mais jovem. Chamámos então a Isabel Rato e o seu quinteto para um concerto pedagógico sobre Jazz e ainda a Orquestra Gerajazz, nascida no seio da Orquestra Geração, projeto centrado na ação e desenvolvimento social através da música, que se inspira no Sistema de «Orquestras Infantiles e Juveniles» da Venezuela. E, à semelhança da edição de 2020, voltámos a convidar um ilustrador para criar a imagem do Festival e para trabalhar com os alunos d’A Voz. A belíssima imagem criada pelo Bernardo P. Carvalho – Planeta Tangerina e os ecos que nos chegaram de alunos e professores, a quem agradecemos a alegria com que nos acolhem, confirmou o acerto da escolha. 

Terminado o segundo O Jazz tem Voz!, o balanço que fazemos é muito positivo e dá-nos força para pensar que este Festival, com as suas marcas distintivas, com o apoio incansável d’A Voz do Operário, está a ganhar o seu espaço no panorama cultural e a criar raízes junto de músicos e do público. Para 2022 está já pensada a terceira edição, sujeita, claro, à «ditadura» do financiamento, essa que estrangula tantos e tantos projectos de qualidade.

Esperamos ver-vos pela Voz em 2022. Até já!

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