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COVID, do meu ponto de vista

Ilustração de Xavier da Silva Cardoso

Através da escrita comunicamos, expressamos o que vemos, o que sentimos e o que pensamos. Xavier Cardoso, 10 anos, aluno da turma 4ºA d’A Voz do Operário da Graça, aproveitou este tempo de confinamento para ler e identificar-se com o escritor austro-húngaro Franz Kafka. Realizou um projeto em conjunto com alguns colegas dando-lhe o título de “Kafka e a sua Metamorfose”, envolveu toda a turma neste seu crescimento enquanto leitor e partilha connosco o texto “COVID, do meu ponto de vista” que diz ser um dos seus primeiros textos “à moda de Kafka”. Realizou um projeto em conjunto com alguns colegas, dando-lhe o título de “Kafka e a sua Metamorfose”, envolveu toda a turma neste seu crescimento enquanto leitor e partilha connosco o texto “COVID, do meu ponto de vista”, que diz ser um dos seus primeiros textos “à moda de Kafka”.

3 de Dezembro. A praga começou.
Eu, Xavier, começo a desconfiar do planeta. Ainda nenhuma praga. Os dias passam e eu fico cada vez mais desconfiado. Nessa altura a notícia sai:

Notícias de última hora, primeiro infetado na China de uma nova praga chamada COVID-19.

Já não era sem tempo. O vírus espalha-se. Ásia. América do Norte. América do Sul. Oceânia. África. Europa. Já sabemos como se espalha. Já sabemos os sintomas. Não há famílias juntas. Cada dia, cada hora, cada minuto, cada segundo, um infetado. Já há alguns mortos, o vírus começa em Portugal.

Ainda não se descobriu a cura. Cada dia, cada morto. Começa a piorar. Já usamos máscara. Não somos super-heróis. Somos otimistas no desespero.

Praga, doença, adoecimento, epidemia, pandemia, tudo vai dar ao mesmo. Nunca há antes, nem depois, há agora. E agora há um vírus. Mas que raio de vírus, em 1918 houve cerca de 50 milhões de mortos. Agora, as escolas fecharam, as lojas fecharam, os parques fecharam.

Agora somos nós que nos fechamos em casa. Em casa, continuamos a trabalhar, sendo que as coisas mudaram. Sou agora o poeta. Cada vez mais nítido o futuro.

Finalmente encontraram a cura.
As ruas estão desertas. Em casa, todos estão. Vagueio entre duas casas. Mãe… Pai… Mãe… Pai… Mãe… Pai. Será que os alienígenas também têm pragas? Começo a ver séries novas, acabo séries velhas. Começo jogos, acabo jogos, começo a treinar, acabo de treinar. Começo a desenhar, acabo de desenhar. É assim que passo o tempo. Desembaraço novos conhecimentos. Enfrento novos dilemas. Ultrapasso dificuldades. Já há bastantes curados. Será que só chegámos aqui para este conhecimento?

Já passou uma semana. O tempo é lento. Cada um a seu tempo. Tic, tac, tic, tac, tic, tac. Começa a estar frio. Já há poucas pessoas na rua para fazer compras. As coisas esgotam-se. Poucas, mas algumas lojas abrem-se. Há lojas em risco, mas a situação acalma-se em Portugal. Em Itália e na Espanha, o vírus está agressivo. Já não viajo, pois quarentena não é para mim. Olho do meu quarto para a janela e vejo um único aldeão a passar, com máscara, claro. Por agora.

Já não há poluição. Poucas pessoas a andar de carro. Agora tenho as vistas longas. Vejo o mar, o céu, árvores, carros, dinossauros.

Por sorte tenho amigos e família, doces como o mel, falo com eles à distância. Começa a ficar calor. Interpreto todos os centímetros cúbicos à minha volta. Cada vez mais carros. Mesmo assim a pouco e pouco. Já há mais break dance. Já estou com alguns amigos ao vivo. Já está a melhorar. Ainda bem. Mesmo assim, esperava mais. Agora, ando um pouco de bicicleta. Não acompanhado, mas a apanhar o vento na cara. O COVID veio de um morcego, o problema era deles, mas agora é nosso. Que natureza!

Outra vez sem mantimentos. Vou à rua, mas com uma máscara. Só minha. Feita pela minha querida e esperta avó. Os sinos tocam. Quatro da tarde. Continuo com os meus passatempos, mas sempre com um pressentimento estranho. Não consigo descobrir o que é. Talvez um bom pressentimento? Uma alegria ou uma tristeza… Agora sinto tudo isto a percorrer por todo o meu corpo, duma ponta à outra. O COVID talvez seja um aviso da natureza ou talvez só um acontecimento normal que alguém previu, sem ser eu. Ou até talvez os dois de diferentes formas. Os cientistas já encontraram a vacina! Tudo volta ao normal. A doença passou a ser uma doença normalíssima.

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