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A desventura das autárquicas nas palminhas das televisões

Quais terão sido as regras do jogo na cobertura mediática das autárquicas, ou qual o critério editorial? Há um estudo que diz que os temas locais e nacionais mais preocupantes parecem ter sido substituídos pelas questões da imigração, da segurança e dos ciganos, uma passadeira mediática para o Chega que viajou nas palminhas da TV.

As recentes eleições autárquicas contaram com um menor número de inscritos, 9.303.840, menos cerca de 20 mil que em 2021 (9.323.688), mas, em contrapartida um maior número de votos entrados em urna. Foram mais meio milhão de eleitores votantes, vindos da abstenção ou exercendo pela primeira vez este dever cívico, fizeram baixar a abstenção de 46,35%, para 40,74%.

Para já, sabemos que apesar dos temas locais – arruamentos, espaços verdes, recolha de lixo, e muitos outros – trazidos por diversas candidaturas para o debate, foram minudências nas agendas mediáticas. Mesmo os grandes problemas nacionais a crise na Habitação, o Serviço Nacional de Saúde ou a Escola Pública não foram suficientemente importantes para os media, pelo que se prevê que se mantenham firmes e sem resposta; até as causas dos incêndios, que deixaram arruinadas as populações de vastas regiões do país, continuam a ser as mesmas todos os anos, apesar dos estudos acumulados em gabinetes criados para o efeito.

Isto é, estas realidades incontornáveis, para a maioria dos eleitores, ainda que trazidas a debate por muitos candidatos, foram trocadas por outros temas, pelo menos mereceram mais atenção por parte da Comunicação Social. A insegurança e a emigração, dois temas colados a cuspo, foram recorrentes e sempre comentados pelo líder do CHEGA. Esta agenda eleitoral mediática seria validada segundo a segundo pelo comentário de Ventura.

A SIC, por exemplo, depois de invocar um critério “editorial” para o seu debate de Lisboa, (partidos com representação na autarquia) decidiu deixar de fora o candidato da CDU. Depois de pressionada acabou por o incluir, mas, para que a coisa fosse equilibrada, acrescentou o candidato do CHEGA, abdicando do tal critério editorial. Já O Público decidiu e excluiu João Ferreira, ponto final.

Mas a coisa foi mais funda. Um estudo do Movimento pela Democracia Participativa indica que “entre 22 de setembro e 11 de outubro de 2025” o Chega e, em particular, André Ventura, alcançou uma visibilidade mediática superior ao PS e PSD, “com picos marcados na reta final da campanha”. Que a “Justiça, assumiu-se como o tema mais persistente e de maior amplitude, enquanto ‘a segurança’ manteve presença estável e a ‘imigração’ e ‘ciganos’ revelaram ciclos curtos e intensos típicos de ‘agenda shock’”. A representação temática “sugere um ecossistema noticioso propenso à amplificação de narrativas polarizadoras típicas do Chega”, conclui.

Para além da menor exposição mediática de PS e PSD – já para não falar dos outros – a presença do CHEGA preencheu períodos determinados, com uma agenda pré-definida. “O Chega foi o partido mais mencionado na imprensa portuguesa durante toda a campanha, reforçando o efeito de sobre representação mediática” refere o estudo.

É claro que houve quem aproveitasse a boleia. Sabemos que, por exemplo, em Loures, o candidato socialista, seguiu a sanha persecutória do CHEGA contra imigrantes, no caso do bairro de Talude e, foi eleitoralmente bem sucedido.

Também sabemos que o governo de Luís Montenegro seguiu essa agenda mediática no processo legislativo, privilegiando as questões da nacionalidade e da imigração, num país de emigrantes, e com falta de mão-de-obra.

Depois, num balanço pós-eleitoral, a leitura empenhada e instantânea de jornalistas, confirmada em direto por repórteres e refletida por comentadores confirmava o PSD com o maior número de autarquias, 136 ao todo, o Partido Socialista folgava com 128 municípios conquistados ou mantidos, a CDU perdia 7 e ganhava quatro, desmentindo profecias e o CHEGA, apesar de tudo e das 60 câmaras fanfarronadas pelo seu líder, revista pouco depois em baixa para 30, acabaria com 3. E onde são elas: em Albufeira, onde um ex-PSD sucede ao PSD; na Madeira, em que um ex-socialista, mal sucedido no PS, inglório no IL chegou agora a vias de facto em S. Vicente; e, por fim, o fenómeno do Entroncamento, onde um ex-emigrante português regressado a Portugal, deu a vitória ao partido que mais demoniza o imigrante.

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