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Saíram à rua para verem passar as bicicletas

Mais de 60 ciclistas treparam o íngreme Vale de Santo António numa prova em que o associativismo foi o protagonista.

A rua desperta enevoada numa manhã preguiçosa de domingo. Faltam poucos minutos para as dez no cimo do Vale de Santo António e é onde se espera que, seis décadas depois, mais de meia centena de ciclistas ultrapasse a meta depois de uma dura subida que arranca ainda abaixo da sede do Mirantense Futebol Clube. Passaram muitos anos, os protagonistas são outros, as bicicletas evoluíram, mas o entusiasmo mantém-se. À mesma hora, junto à porta da histórica coletividade, dezenas de participantes conversam entre si sobre a dificuldade da prova.

“É para esticar um pouco os limites, mas que é íngreme, lá isso é. O divertido vem depois quando acabar a subida”, comentam à Voz do Operário dois amigos já posicionados em cima dos selins. Enrico e João costumam fazer ciclismo de forma recreativa e acham que é importante dar visibilidade às bicicletas, sobretudo quando se trata de uma iniciativa de bairro que envolve o associativismo e a população.

Questionado sobre a expetativa em relação à subida, um participante belga brinca e afirma que o objetivo é ganhar. Explica que vive no bairro e que o espírito associativo é determinante para ligar os moradores. Ao lado, um voluntário do Mirantense destaca a quantidade de jovens que se juntaram naquela manhã e mostra-se confiante de que esta iniciativa se possa voltar a repetir.

Oitenta anos depois da primeira prova, organizada em 1941 pelo Mirantense Futebol Clube, a histórica coletividade juntou-se à recém fundada Associação Recreativa e Desportiva “O Relâmpago” para relançar este desafio ciclista. Os jornais da época davam conta do entusiasmo da população que se acotovelava nos passeios para ver passar os ciclistas. 

É Vasco, um dos organizadores, quem inaugura a prova. O ciclista veste as cores do “Relâmpago” e há quem se emocione quando imprime força nos pedais para escalar a encosta. Pese a distância no tempo, a expetativa é muita. Irrompem os aplausos rua acima. Às janelas, há senhoras de robe, moradores de cabeça esticada no parapeito e gente nas laterais. Com apenas um árbitro disponível, que dá o sinal da partida, voluntários do “Relâmpago” introduzem-no rapidamente dentro de uma viatura e ultrapassam a bicicleta para chegarem antes à meta. Quase parece um filme do Kusturica. É ali que o representante da Federação Portuguesa de Ciclismo monta o aparelho que vai contar o tempo de cada subida.

“Foi incrível”, descreve Vasco à Voz do Operário quando ultrapassa a meta. “Mal virei a primeira esquina estava muita gente na rua a gritar e até na parte mais difícil havia imensa gente e depois foi tentar aguentar até aqui”. Ainda com a respiração acelerada, explica que custou um pouco organizar a iniciativa, até porque foi a primeira vez que organizaram este tipo de provas. “De certa forma, estávamos a aprender enquanto fazíamos”, refere.

Enquanto os cerca de 60 ciclistas, um a um, trepam o Vale de Santo António, Paula e Fátima, que vivem aqui há 50 anos, gritam palavras de incentivo entre os carros estacionados. “Isto é muito giro, a gente diverte-se e o bairro vem para a rua”, comentam. 

Ao longo da rua, são muitos os voluntários que controlam as ruas adjacentes permitindo que a casa 15 ciclistas se pare a prova por cerca de 15 minutos para fazer escoar o trânsito limitando ao máximo o incómodo causado. Num desses intervalos, sobe um autocarro da Carris sob aplausos com o motorista a dizer adeus como se de um ciclista se tratasse.

As palmas sobem de tom quando avançam as mulheres inscritas para a prova. À janela, uma moradora não deixa de aplaudir com as mãos e com um sorriso. “Já que o presidente [da freguesia] não faz nada, ao menos que façam os outros”, espeta uma moradora da janela. Maria João vive aqui há cinco anos e considera que é “engraçado” e que “vale a pena” a iniciativa.

O êxito da prova é visível na alegria estampada nos rostos dos organizadores. Com um pódio a preceito, Lina Cortes, do Mirantense, e Euprémio, do “Relâmpago”, agradecem aos participantes e ao comércio local que não deixou de apoiar a iniciativa. Os vencedores da prova recebem medalhas e ramos de flores mas os maiores aplausos vão para as duas coletividades que organizaram a prova. Parecem ser, afinal de contas, os verdadeiros campeões desta manhã de outono.

Classificação Feminino 18-50 anos

1° Margarida Viseu Roque Amaro | 2m25,76s

2° Marta Gonçalves Vieira | 3m33,31s

3° Inês Sanches | 3m48,07s

Classificação Masculino 18-50 anos

1º Ciaran Finnegan | 1m30,24s

2º Elliot Butler | 1m31,86s

3º Manuel Acácio Bello Lino | 1m38,25s

Classificação Masculino +50 anos

1° José Gonçalves | 3m10,02s

2° António João Martins Gomes Santos | 3m40,66s

3° Alberto Jorge Leite dos Santos | 4m03,28s

Classificação Bicicletas elétricas

1° Paulo Antunes | 2m39s

2° Harald Rothermel | 3m30s

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