Opinião

Presidente

Enquanto se discutem os casos e casinhos, a política que interessa aos portugueses fica esquecida

Manuel Figueiredo, presidente da direcção d’A Voz do Operário.

Assistimos nos últimos tempos ao empolamento de casos e casinhos, com grande deleite da comunicação social, conseguindo-se com isso fazer esquecer os reais problemas dos portugueses, esse sim o verdadeiro debate político que deveria ser feito.

Não se pretende, naturalmente, minimizar a importância dos casos, sendo que alguns são efetivamente sérios e preocupantes, mas antes demais importa debater as questões de fundo que muitas vezes lhes estão subjacentes e não apenas a espuma que dos mesmos emana.

A TAP tem estado no centro das atenções, com situações tão graves como indemnizações chorudas indevidas, roubo, ameaças físicas e utilização abusiva dos Serviços de Informações da República, mas, sem lhes retirar relevância política, para os esclarecer existem o Ministério Público e a Polícia Judiciária.

Apesar de muito se falar da TAP, não se tem debatido e trazido ao conhecimento público questões tão importantes como os contornos da sua privatização na 25ª hora pelo Governo PSD/CDS, já demitido e sem qualquer legitimidade política para tal, nem tão pouco se discute a pretensão do atual Governo de nova privatização.

O Governo PSD/CDS escondeu do povo português o ruinoso negócio de privatização da TAP, o qual foi feito à custa da própria empresa, não tendo o investidor privado, David Neeleman, desembolsado um único tostão. 

Com efeito, este recebeu da Airbus uma comissão de 230 milhões de euros, pelo contrato de compra de 53 aviões. Essa quantia permitiu-lhe pagar os 10 milhões de euros da compra da TAP e utilizar a verba restante na sua capitalização, que lhe possibilitaram o controlo total da empresa.

A obrigação de compra dos 53 aviões passou para a TAP, que ficou vinculada a pagar uma indemnização de 230 milhões de euros caso não a concretizasse, ou seja, na prática a TAP devolveria à Airbus a comissão que esta entregou ao investidor privado.

A alteração da correlação de forças na Assembleia da República, com o consequente derrube do Governo PSD/CDS, permitiu que o novo Governo procedesse à reversão da privatização da TAP, mas com contornos tais que os interesses privados não foram beliscados, designadamente quanto à própria gestão de empresa.

Por outro lado, enquanto se vai desenvolvendo o enredo em torno da novela da TAP, vai-se encobrindo a questão essencial de momento que se prende com a intenção de Governo de concretizar a sua privatização.

Recorde-se que o processo de privatização da TAP já vai longo, sempre na falsa premissa de evitar a sua falência. Em 2000 era para ser comprada pela Swissair e em 2012 pela Avianca, mas afinal quem faliu foram as potenciais compradoras.

O processo da nova privatização está em curso, já se perfilando os privados no assalto ao pote. Para isso, como disse o Presidente não executivo da TAP, o “corte nos trabalhadores foi até ao osso” (redução do número de trabalhadores e cortes salariais). Claro que, como sabemos, os cortes não foram para todos, uma vez que para os Administradores continua a haver dinheiro para vencimentos verdadeiramente escandalosos.

Enquanto isto, não se discutem os efeitos nefastos de nova privatização nem se debate a questão central que é a estratégia duma TAP ao serviço do país, aprendendo-se com os erros passados e defendendo a soberania nacional.

Paralelamente, prossegue uma política de ausência de resposta aos problemas dos portugueses, com o agravamento da exploração que se manifesta numa cada vez mais injusta distribuição da riqueza, em que as opções do Governo não descolam das que são partilhadas pela direita, independentemente de polémicas fabricadas e confrontos verbais com os quais se procuram disfarçar a comunhão de orientações, como o comprovam a convergência em votações e discussões parlamentares nas questões políticas essenciais. 

A título de exemplo está a recusa do Governo em eliminar as normas gravosas da legislação laboral, nomeadamente a caducidade da contratação coletiva, bem como o desinvestimento nos serviços públicos, alimentando com isso as conceções liberais de ataque a tudo quanto é público, quando pelo contrário a solução está na aposta séria no serviço público, investindo em meios humanos e equipamentos, mantendo o seu carácter universal e geral.

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