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Como se tempera o aço. Um século a construir o futuro com o PCP

Foto: Arquivo PCP

Foi a 6 de março de 1921 que nasceu o Partido Comunista Português. Esteve na clandestinidade quase metade da sua existência, encabeçou a resistência contra o fascismo e foi um dos principais protagonistas da revolução de Abril. Hoje, continua a ser um partido imprescindível na defesa dos interesses dos trabalhadores e carrega um projeto revolucionário.

Portugal era um barril de pólvora. A participação na primeira guerra mundial afundou o país numa grave crise económica e social. Então, o anarco-sindicalismo era o que de mais avançado havia no seio da classe operária. Através do movimento sindical, os trabalhadores desencadearam uma vaga de greves para conter o aumento da exploração e a degradação das condições de vida.

Com o apoio da União Operária Nacional, cresceram os protestos e, no calor dessas lutas, a classe operária conquistou, finalmente, a histórica vitória da jornada de 8 horas de trabalho para o comércio e indústria. Em setembro de 1919, as organizações sindicais deram um novo passo para o reforço da sua unidade e fundaram a Confederação Geral do Trabalho (CGT), que chegaria às dezenas de milhares de membros.

Contudo, em 1917, a Rússia foi o epicentro de um terramoto político que havia de marcar a história do proletariado. Depois da Comuna de Paris, em 1871, a revolução socialista de Outubro e a criação do primeiro Estado operário mostraram que era possível através da experiência dos revolucionários russos alcançar o poder. 

Também em Portugal, como noutros países, surgiu um movimento de apoio à causa bolchevique. Criaram-se círculos de estudo e divulgação das ideias que chegavam do outro lado da Europa. Em abril de 1919, foi fundada a Federação Maximalista Portuguesa, antes Soviet de Propaganda Social, que passou a editar o semanário Bandeira Vermelha. Só no distrito de Lisboa havia 29 núcleos desta organização.

Em novembro do ano seguinte, realizaram-se várias reuniões nas sedes de alguns sindicatos, com o objetivo de criar uma estrutura que fosse a vanguarda revolucionária da classe operária portuguesa. 

A prova de fogo do futuro Partido Comunista Português (PCP), começou logo no primeiro encontro da recém formada Comissão Organizadora. Estava marcado para o dia 20 de dezembro de 1920, na sede da Associação dos Caixeiros de Lisboa, na rua António Maria Cardoso. Manuel Ribeiro, diretor do Bandeira Vermelha, estava preso já há dois meses e não podia participar na reunião. A presidir os trabalhos, Eduardo Metzner viu como a polícia invadiu o edifício e proibiu o encontro sob a justificação de que os promotores da reunião não possuíam a devida autorização do governador civil e que não podiam ser discutidos assuntos políticos na sede de um sindicato. Apesar da repressão policial, em janeiro e fevereiro de 1921, a Comissão Organizadora elaborou as bases orgânicas deste novo partido.

Fundação do PCP

Quem está habituado a subir a Rua da Madalena sabe que é uma artéria inclinada. Os operários que subiram esta encosta de Lisboa no dia 6 de março de 1921 estavam a dar os primeiros passos para a fundação de um partido que seria a grande força da resistência ao fascismo, obreiro da revolução de Abril e estandarte do socialismo e da luta dos trabalhadores por melhores condições de vida. Do lado direito da rua, no nº 225, no 1º andar, um por um, entraram pela porta da sede da Associação dos Empregados de Escritório para celebrar a assembleia que elegeu a primeira direção do Partido Comunista Português. Portugal assistia há precisamente cem anos ao nascimento de uma organização que decidiu levar adiante as ideias dos alemães Marx e Engels e do russo Lénine. Quando faz a sua apresentação pública, o Partido Comunista Português publicou os 21 pontos da Internacional Comunista, que constituem a sua base política, confirmando a sua adesão à constelação revolucionária que despontava em todo o mundo. Ao longo de um século de história, os comunistas portugueses protagonizaram episódios que marcaram de forma indelével um percurso que se confunde com a história da luta da classe trabalhadora.

Partido da resistência antifascista e da revolução

Quase metade dos cem anos que os comunistas portugueses agora celebram foram passados na clandestinidade. Logo em 1926, apenas cinco anos após a fundação, quando o partido ainda se estava a erguer e com limitada influência, realiza o seu segundo congresso na Caixa Económica Operária. Comparecem ainda cerca de 100 delegados mas o encontro interrompe os trabalhos porque no dia anterior dá-se o golpe militar que instaurou a ditadura fascista.

Em 1929, o operário Bento Gonçalves torna-se secretário-geral do PCP e dirige uma reorganização para construir um partido de orientação marxista-leninista combatendo conceções anarco-sindicalistas e reviralhistas. É durante este período que se dão duras lutas contra a fascização do Estado que assistem à intensificação da repressão fascista com Salazar.

Muitos dirigentes e militantes do partido enchem as prisões e inauguram o campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde. Entre muitos outros, em 1942, é ali que morre, vítima do fascismo, Bento Gonçalves. Durante este período, dá-se uma nova reorganização do partido que o tornaria numa organização nacional determinante nas lutas operárias e camponesas, ganhando prestígio junto dos trabalhadores e intelectuais. É também em 1943 que se dá o terceiro congresso do partido, na clandestinidade, que elege Álvaro Cunhal, José Gregório e Manuel Guedes para o secretariado do Comité Central, com históricos como Pires Jorge, Sérgio Vilarigues, Alfredo Dinis e Dias Lourenço.

Quase meio século de crimes contra os comunistas e outros democratas, não puderam acabar com o único partido que sobreviveu à ditadura. Para além dos assassinatos e da tortura, muitos pagaram com a prisão.

É já em 1961, depois da fuga de Peniche de 10 dirigentes do PCP, entre os quais Álvaro Cunhal, que seria eleito secretário-geral, que se traça o caminho para a derrota do fascismo através de um levantamento nacional “com a participação ou neutralização de grande parte das forças militares”. Esta linha, inscrita no relatório do Comité Central, intitulado de Rumo à Vitória, constituiu o farol político dos comunistas até ao derrubamento da ditadura.

As reivindicações operárias e camponesas, também das mulheres, os protestos estudantis e a luta dos povos africanos contra o colonialismo e pela sua independência tiveram a participação e o apoio dos comunistas portugueses que em 1965 anunciaram o Programa para a Revolução Democrática e Nacional, aprovado no sexto congresso. 

Culminando quase cinco décadas de resistência e luta popular, os capitães do Movimento das Forças Armadas derrubaram o governo fascista e abriram o caminho para conquistas sociais que tiveram a ampla participação dos trabalhadores e do povo. O indiscutível papel do PCP na resistência ao fascismo aumentou exponencialmente o prestígio do partido. Em outubro de 1974, o PCP tinha cerca de 30 mil militantes e em sete meses passa para 100 mil.

Apesar da contra-revolução, a capacidade de resistência, ao lado do movimento operário e popular, fazem dos comunistas, ainda hoje, um dos principais porta-vozes das conquistas sociais, políticas, económicas e culturais do processo revolucionário. Cem anos e muitas gerações depois, o PCP continua a enunciar, como em 1921, o propósito de transformar a sociedade para acabar com a exploração e alcançar uma sociedade de paz, progresso e justiça social.

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