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50 anos do 25 de Abril

O Poder de Abril

Se o poder político sucumbiu na tarde de 25 de Abril de 1974, o que aconteceu com o poder económico?

O historiador Manuel Loff sustenta que a mesma Revolução que decapitou o poder económico “nunca triunfou no país todo”. Sem força para influenciar o poder político, o poder económico refez-se gradualmente a partir do primeiro governo de Soares e voltou a dominar o poder político com Cavaco.

A revolução, sustenta o historiador Manuel Loff, “tem várias fases e, é evidente que, na sua primeira e segunda fases, até ao 11 de Março de 1975, ainda se nota o peso do poder económico, dos setes grandes grupos económicos chamados sete magníficos (CUF, Espírito Santo, Champalimaud, BPA, Borges & Irmão, BNU, Fonsecas & Burnay).

Era um poder financeiro, diz ML, “com ligação aos investimentos na economia colonial, com um peso central nas políticas do salazarismo, pelo menos desde inícios dos anos 50”. Ramos dos Santos, citado no livro “Os Donos de Portugal”, precisa: Antes do 25 de Abril, a economia “era dominada por 44 famílias” detentoras dos sete grupos económicos que “dominariam 300 empresas, incluindo as oito maiores indústrias” e “dominantes nos setores básicos, na grande indústria de capital intensivo, como na produção de bens intermédios, na banca comercial, no setor segurador e nos transportes marítimos”. 

Loff situa as duas fases do processo revolucionário, entre o 25 de Abril, a derrota de Spínola na questão da descolonização em julho de 74, e o 28 de Setembro”. Há depois uma segunda fase que é “a perda gradual e o desespero da direita spinolista, até ao 11 de março de 1975”. Porque justifica, “o 28 de setembro e a demissão do Spínola dão o tom da viragem política à esquerda e do peso que, os movimentos sociais e de contestação, tinham cada vez mais”. A burguesia perdeu, sustenta, “o controlo do Estado”. E, questiona, “perdendo o controlo do Estado como é que um patrão enfrenta uma greve? 

Até ao 11 de Março, “ainda há um forte poder económico” que, “em perda de influência política”, organiza “fuga de capitais, fuga de equipamentos, desmantelamento das próprias empresas”. “Aquilo que se descreveu como uma sabotagem económica à Revolução para salvar o que puder ser salvo e encontrar no exílio formas de financiar o 28 de Setembro, o 11 de Março, e a atividade de operacionais da PIDE e dos setores militares que tinham feito a guerra, (Kaúlza, Alpoim Galvão, etc.) e estavam disponíveis para aquilo que será o golpismo do 28 de Setembro, do 11 de Março e sobretudo o terrorismo de extrema-direita em 1975”.

Em Portugal, até 11 de março de 1975, refere ML “ainda que haja um grande consenso nos programas dos partidos políticos que aprovarão a constituição relativamente ao desmantelamento dos monopólios, as nacionalizações não tinham avançado”. 

O próprio PPD de Sá Carneiro, vinca-se em “Os Donos de Portugal”, emitiu um comunicado no 11 de Março referindo que a “intentona militar só tinha sido possível porque o saneamento fora insuficiente” e, dias depois, apoiava “o decreto nacionalizador”.

“Dizer que foram os comunistas que forçaram as nacionalizações é não perceber o que foram os anos 60 e os anos 70”, sustenta Loff. E lembra as nacionalizações de Harold Wilson em 1974, na Grã-Bretanha, ou o programa comum da esquerda de François Mitterrand, também em 1974, “quando os socialistas já tinham uma representação parlamentar superior à dos comunistas e tinham um programa baseado em nacionalizações” ou na Itália governada pela Democracia Cristã “ininterruptamente, com coligação ou sem, entre 1944 e 1992, com um setor empresarial do Estado muito superior ao resultante das nacionalizações em Portugal”.

Em Portugal dá-se uma lenta recomposição do capital “sobretudo a partir do primeiro governo de Mário Soares, que passa pela recomposição dos velhos grupos económicos, e pela abertura a novos grupos como a SONAE e o Grupo Amorim”. A partir de Soares, a constituição não era respeitada pelos sucessivos governos. No segundo governo cavaquista altera-se a constituição e o sistema económico, “que ainda não era neoliberal, passou a ser com o poder político a voltar a submeter-se ao poder económico”.

O historiador defende ainda que a Revolução é vítima dos ataques apoiados no estrangeiro, do financiamento dos grandes grupos económicos, mas “perde-se em Portugal”. Porque, explica, “a tese de que a Revolução estava ganha e de que há uma ingerência estrangeira e de que é o terrorismo que a derrota, é uma tese lisboeta e alentejana. Porque não se lembram do que era o resto do país. A revolução nunca triunfou na totalidade do país, muito menos nas ilhas”, concluiu.

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