Das sementes lançadas à terra através de muito sacrifício e luta coletiva, nasceu há 50 anos, em plena ditadura fascista, a Confederação Nacional dos Trabalhadores Portugueses. Aquela que começou por se chamar Intersindical, hoje CGTP-IN, é a maior organização social do país e conta com um património histórico de resistência e conquistas que são fruto das mulheres e dos homens que nos locais de trabalho constroem um futuro de justiça e progresso social.
No ano em que cumpriu 30 anos, Daniel Cabrita foi eleito presidente do Sindicato dos Bancários de Lisboa. Num tempo em que as greves estavam proibidas, em que o corporativismo era um pilar do regime e em que só os sindicatos nacionais, autorizados pelas autoridades fascistas, podiam desenvolver atividade junto dos trabalhadores, foram muitos os que desafiaram o poder para conquistar direitos.
Eram os tempos de uma “primavera marcelista” com flores de chumbo. Este barreirense, bancário no Totta, foi um deles. Eleito em 1968, a tomada de posse só ocorreu em 1969, quase um ano depois devido à falta de homologação ministerial. Em 1970, num outubro há meio século de distância, Daniel Cabrita foi anfitrião de um primeiro encontro histórico que lançou as bases para construção de um potente movimento sindical de classe.
Os contactos individuais entre membros antifascistas das várias direções sindicais que tinham ganho eleições desembocaram numa convocatória lançada a 1 de outubro de 1970 para uma reunião a 11 do mesmo mês na sede do Sindicato dos Bancários com diferentes estruturas. “As reuniões foram um pouco à experiência para ver o sentido das direções sindicais que lá estavam e debruçaram-se sobretudo sobre assuntos como a contratação coletiva e o direito de reunião”, descreveu Daniel Cabrita à Voz do Operário.
Bancários, lanifícios, metalúrgicos e caixeiros juntaram-se em encontros intersindicais e chegaram à conclusão que eram muitos os problemas comuns a todos os trabalhadores. “O resultado positivo desse dia foi a decisão de se continuar a reunir e a tomada de posição conjunta enviada ao governo da altura a contestar a proibição das reuniões”, recorda o antigo dirigente sindical.
Como muitos outros sindicalistas, ao longo do fascismo, em junho de 1971, foi preso e submetido a várias torturas. Num contexto em que o governo lançou uma vaga repressiva contra o movimento sindical anti-corporativo que encabeçava o aumento da contestação nos locais de trabalho acabou encarcerado dois anos em Caxias e em Peniche. A sua prisão desencadeou uma enorme onda de protestos, não só a nível nacional, como internacional. Saiu em junho de 1973 proibido de exercer atividade sindical e voltou ao banco onde trabalhava mas sem nunca deixar de participar na luta.
Menos de um ano depois, a Intersindical manifestava o seu apoio ao Movimento das Forças Armadas a 25 de Abril numa revolução que com a participação dos trabalhadores e do povo ditou o fim a 48 anos de fascismo. À frente do processo de democratização e destituição das direções corporativas nos sindicatos, a Intersindical protagonizou a maior manifestação alguma vez vista em Portugal. O 1.º de Maio de 1974 arrastou para as ruas a força de um povo que acabava de derrubar a ditadura e que aspirava construir um país sem injustiças sociais.