Este reconhecimento provocou sentimentos de júbilo na região, particularmente nas populações envolvidas, e no país. Não é motivo para menos, pois os eventos em causa marcam ainda momentos importantes na vida das comunidades locais.
Com efeito, este evento insere-se na realização de festividades que abrangem um período de inverno, com incidência generalizada em torno do período do natal/dia de reis. estendendo-se ao Carnaval, e que ainda têm lugar em cerca de 30 localidades da parte nordeste da região de Bragança, e também para lá da fronteira portuguesa. Com origens pagãs em comunidades agro-silvo-pastoris, incorporaram posteriormente a componente religiosa católica com as festas em honra a Santo Estevão – jovem mártir da cristandade, sendo então designadas de Festas dos Rapazes ou de Santo Estevão.
É inegável o impacto para as comunidades envolvidas, pois, não obstante factores de modernidade que alteram o seu carácter tradicional, elas continuam a ter lugar e a mobilizar participantes, uma vez que dão resposta a necessidades do viver das comunidades e seus elementos. Daqui se destacam os factores de reafirmação de elementos de identidade e pertença, onde rituais de passagem propiciam protagonismo a jovens com aspirações ao estatuto de adulto. Outra característica associada a estes eventos são os excessos de comida, bebida, a violação e a alteração da norma e as catarses traduzidas na crítica social dos podres do ano, expressa publicamente e declamada em jeito de verso ou texto apropriado. No entanto, sublinha-se a ocorrência de particularidades de cada localidade, traduzidas, por exemplo, na corrida da rosca (prova atlética) e também a galhofa, que tem lugar em Grijó de Parada e Parada, e que consiste em luta corpo a corpo entre dois jovens – rituais ilustrados no filme pioneiro do designado cinema etnográfico, Festa, Trabalho e Pão em Grijó de Parada, de Manuel Costa e Silva.
Como já referido, a modernidade coloca várias questões que obrigam a uma ponderação, nomeadamente nas considerações sobre conceitos em torno de cultura. Com efeito, as novas realidades propiciam e estimulam a alteração dos contextos em que estes eventos se movem, desde logo o lugar e o tempo, traduzido, por exemplo, no facto de os Caretos de Podence – não sendo caso único – participarem em inúmeras iniciativas culturais, recreativas e até políticas, noutro lugar e noutro tempo para além do Carnaval em Podence. Também os protagonistas, outrora exclusivamente homens e do lugar, envolvem hoje novos agentes, incluindo mulheres.
Facto é que há uma transversalidade, quase unidade, que une estes vários ritos das festas de inverno. Assim, parece legítima a questão sobre a pertinência desta candidatura ser complementada com um consequente e lógico alargamento aos eventos e lugares em referência, uma vez que estes partilham a mesma génese, transportando também um carga simbólica importante e atuante, ainda nos dias de hoje. Não é por isso de estranhar que, neste momento, as outras populações directamente abrangidas, se questionem sobre a razão restrita desta candidatura e a consequente inevitável marginalização sócio-cultural que opera. Independentemente das especificidades em causa, ninguém consideraria razoável , a título de exemplo, que a consagração do Fado distinguisse o de Alfama em detrimento do da Mouraria, ou que a do Cante Alentejano especificasse o da Vidigueira, mas não o de Aljustrel.