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No mês do trabalhador, “A Classe operária vai para o paraíso”…

Lulù Massa (Gian Maria Volontè): trabalhador numa fábrica em que, como os outros, se confunde com uma máquina. Os seus movimentos repetitivos e acelerados lembram “Os Tempos Modernos” (1936), de Chaplin. Mas, em “A Classe Operária vai para o Paraíso”, realizado por Elio Petri, estamos no início dos 70, em Itália.

La classe operaia va in paradiso / 1971. “A classe operária vai para o paraíso”

O homem confundido com a máquina

Lulù Massa (Gian Maria Volontè): trabalhador numa fábrica em que, como os outros, se confunde com uma máquina. Os seus movimentos repetitivos e acelerados lembram “Os Tempos Modernos” (1936), de Chaplin. Mas, em “A Classe Operária vai para o Paraíso”, realizado por Elio Petri, estamos no início dos 70, em Itália. Lulù Massa, no começo do filme, está pouco consciente da sua situação, não se importando de ser comparado à máquina e à quantidade de peças que produz por hora. Em casa, a tensão continua: vive com o enteado e uma mulher com quem tem pouca ou nenhuma intimidade. 

Este homem – que podia ser qualquer operário fabril de qualquer parte do mundo – está exausto. É um homem sem sonhos e perspectivas, além de estar na fábrica durante oito horas e ser o mais produtivo que conseguir – isso equivale a mais liras (antiga moeda italiana), dinheiro esse não corresponde a mais bem-estar.

Porque Massa não é um número nem um autómato, ao acelerar o processo mecanicista de produção, tem uma falha, e fica sem um dedo. O desassossego aumenta.

A revolta já andava no ar, no exterior, no descontentamento dos outros colegas. A revolta já tinha feito “enlouquecer” o antigo agitador das águas na fábrica. Lulù Massa visita-o num manicómio, onde se mistura com outros que deliram (ou estão apenas lúcidos da sua condição…), caminham e permanecem sentados num espaço minúsculo.

“A sociedade torna o indivíduo numa máquina, ao ponto de duplamente o alienar através da insanidade psiquiátrica, deslocando-o do perverso sistema capitalista para uma margem de ninguém. ” 

A sociedade torna o indivíduo numa máquina, ao ponto de duplamente o alienar através da insanidade psiquiátrica, deslocando-o do perverso sistema capitalista para uma margem de ninguém.  

A luta de uma classe e de um homem só

O protagonista não tem filtro, faz o que quer e diz o que pensa. A partir do acidente, o seu carácter e a sua revolta intensificam-se. A eles se agregam as greves e manifestações dos restantes trabalhadores, apoiados por sindicatos. Na fábrica, Lulù Massa é controlado por um rapaz de bata branca, que o adverte para a redução da produtividade. O supervisor até o quer desculpar, mas Massa diz que está a fazer de propósito: mais peças para ter mais dinheiro, para quê? 

No meio do turbilhão, é despedido; no meio do turbilhão, visita a ex-mulher e o filho (que parece gostar menos dele que Arturo, o enteado). No meio do turbilhão, a companheira sai de casa. Lulù Massa fica sozinho; algo quebra no seu interior: a esperança de que as coisas possam melhorar. E, por ter batido no fundo, nada mais tem além da luta, mesmo que esta lhe pareça, a certa altura, solitária. “A causa é por todos e não por um homem só.” “E como?”, pergunta Massa ao sindicalista, que tenta ter um momento de descanso numa escola em convulsão política. “Comida arranja-se sempre”, responde-lhe o outro. 

Massa quer trabalhar, sente-se infeliz e frustrado. Em desespero, leva uma jovem colega às instalações abandonadas da fábrica de tintas onde trabalhou anos antes. Esta era a rapariga que o fazia produzir mais, pensava nela, vangloriava-se; mas agora tudo corre de forma atabalhoada dentro do carro, sem erotismo ou amor. As desilusões acumuladas parecem deixá-lo à beira da insanidade (ou da consciencialização). Enche a casa de estudantes e outros clandestinos perseguidos; visita com frequência o ex-colega que está internado, confundindo-se com aqueles que, agora no manicómio, foram trabalhadores: guardas, operários, carteiros, derrotados pela máquina que torna pessoas em animais doentes. 

A resistência da classe operária e o “paraíso” de mais direitos

Para onde podem ir os trabalhadores sem luta? O filme de Elio Petri sublinha que a resistência activa conquista a liberdade e os direitos; mesmo sem serem necessárias atitudes extremistas e radicais (como, a certa altura, os sindicalistas argumentam). A luta da classe operária e as greves fazem recuar o patronado na decisão de despedir Matta, e mudam os critérios de pagamento dos salários. 

“O filme de Elio Petri sublinha que a resistência activa conquista a liberdade e os direitos.”

Aqui, terceira parte do filme, Lulù Massa está já no limiar do equilíbrio: fechado em casa, entre objectos inúteis, que são apenas reflexo de um mundo consumista e capitalista, faz a reconversão de cada um dele em liras e horas de trabalho despendidos para os comprar. Em última análise, o sistema vive da sua própria perversão para crescer, obrigando os cidadãos mais desprotegidos a trabalhar para gastar o salário em bens não-essenciais.     

“A Classe Operária vai para o Paraíso” é uma metáfora. Os que mais se sacrificam e menos sonhos e fé têm de melhorias nas condições de vida, são aqueles a quem está já – por direito e questão de justiça social e moral – reservado o lugar do paraíso. 

“A Classe Operária vai para o Paraíso” é a forma directa e justa que Petri encontra para concluir que a resistência, o não-conformismo, a luta por mais direitos e melhores condições laborais, económicas, sociais e pessoais terão com resultado um paraíso. Mesmo que o “paraíso” seja o direito a dizer: Basta! O povo é quem mais ordena. O direito a ter voz activa perante o patronato. A poder dizer que não se produz mais dos que o desejável para uma jornada de trabalho. A classe operária teve e continua a ter palavras de ordem e acções fundamentais a manifestar. Direitos a reivindicar. 

No mês do 1º de Maio, mês do Trabalhador, é crucial lembrar um dos filmes que traz para o centro da narrativa a luta de um homem e a luta de todos os operários contra a alienação. Por um trabalho e uma sociedade mais humanas e igualitárias. 

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