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Memória

Alexandre Vieira e o diário sindicalista A Batalha: um destacado colaborador d’A Voz do Operário

2019 é o centenário do diário sindicalista A Batalha. Publicou-se entre 1919 e 1927 e teve então um papel central como pilar e porta-voz da organização operária e sindical portuguesa. Alexandre Vieira foi um dos seus principais fundadores e seu primeiro diretor.

Minho

Alexandre Vieira nasceu a 11 de Setembro de 1880 na cidade do Porto mas foi mais a norte, em Viana do Castelo, que passou a infância e começou a trabalhar aos 11 anos de idade. Foi na região minhota que se tornou operário gráfico e sindicalista. Dali escreveu pela primeira vez para A Voz do Operário. Em 1906 migrou para Lisboa.

República

No dia 18 de Março de 1908, aniversário da Comuna de Paris, foi um dos fundadores do diário sindicalista A Greve. Este apenas durou seis meses, mas foi uma experiência audaz à época, assente em trabalho voluntário desde a redação à impressão e à distribuição. O chefe de redação foi José Fernandes Alves, que era também o chefe de redação d’A Voz do Operário.

No desempenho destas funções, esteve na linha da frente de grandes desafios que então se colocaram aos trabalhadores portugueses. Destacamos três:

Repressão

a) a repressão do novo regime republicano, nomeadamente sob a liderança de Afonso Costa. Houve sedes sindicais encerradas, jornais apreendidos, militantes presos e até algumas pessoas mortas a tiro em manifestações, logo a partir de 1911. Alexandre Vieira foi então várias vezes preso. E não foram apenas curtas detenções: em 1913/14, chegou a estar 9 meses encarcerado.

Fome

b) a crise social exponenciada pela 1ª Guerra Mundial. A rotura de circuitos do comércio internacional foi devastadora para um país muito dependente de importações de alimentos. A miséria agravou-se com a escassez e especulação de géneros, e uma inflação galopante. Em 1917 chegaram a ocorrer tumultos em Lisboa, com multidões esfomeadas assaltando armazéns para conseguir comida. Alexandre Vieira foi então um dos responsáveis por uma redinamização do movimento sindical, para
que os trabalhadores se organizassem e defendessem os seus interesses.

Guerra civil

c) Em janeiro de 1919 o país chegou à guerra civil, com monarquia autoritária a ser restaurada no Norte do país. Como muitos operários e sindicalistas, Alexandre Vieira participou na revolta armada que derrotou as forças monárquicas às portas de Lisboa, em Monsanto.

A Batalha

Foi então que nasceu A Batalha. O primeiro número saiu a 23 de Fevereiro de 1919, por iniciativa da União Operária Nacional, que nesse ano se transformaria em Confederação Geral do Trabalho (CGT). Várias vezes esse jornal foi apreendido e a sua redação assaltada. Até que em 1927 a ditadura militar o suspendeu e destruiu a redação. Em 1930 voltou a ser publicado legalmente, como semanário, mas por pouco tempo. Apareceu de-
pois clandestinamente mas de forma muito irregular, nas décadas de 1930 e 1940. Renasceu com o 25 de Abril de 1974 e ainda hoje existe, a assumindo-se agora como um “jornal de expressão anarquista”.

Anarquista

Alexandre Vieira era anarquista, como foram muitos sindicalistas da sua geração. E manteve as suas convicções até falecer, em 1973. Mas quando o movimento sindical português foi dilacerado por uma rivalidade entre anarquistas e comunistas, nos anos 1920, Vieira tomou então uma posição de diálogo e defesa da unidade. Em 1928 integrou uma delegação de sindicalistas portugueses à Rússia soviética.

Antifascista

Ao regressar da Rússia, Vieira acabou por ficar exilado em França durante 4 anos. Só chegou a Portugal em 1932. Os sindicatos livres foram proibidos logo em 1933. Mas, à semelhança doutros velhos sindicalistas, manteve-se ativo e organizado. Foi dirigente da Universidade Popular Portuguesa e presidente da Associação dos Inquilinos Lisbonenses. Teve ainda um papel destacado no Movimento de Unidade Democrática (MUD).

A Voz do Operário

Sócio desde 1908, Alexandre Vieira foi eleito em 1926 para um órgão auxiliar da direção d’A Voz do Operário, a “comissão de instrução, arte e educação”. Nas décadas de 1950 e 1960 foi um destacado colaborador deste jornal, a exemplo de vários outros antigos colaboradores d’A Batalha que durante a ditadura colaboraram n’A Voz do Operário. Nomes como Emílio Costa, César Nogueira ou José Antunes. Este último foi mesmo o diretor d’A Voz do Operário em 1946 e de novo em 1956/58.
Uma nota final para sublinhar que Alexandre Vieira foi um dos responsáveis pela salvaguarda da biblioteca da antiga Universidade Popular, com a sua transferência em 1950 para A Voz do Operário, onde foi preservada.

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