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A Linha Circular ou o carrocel dos Fundos Imobiliários

Quando, há aproximadamente um ano, o Metro iniciou as obras da Linha Circular no Campo Grande, solução que une as Linhas Amarela e Verde numa só, ligando o Rato ao Cais de Sodré, milhões de pessoas que usam o Metro como principal solução de mobilidade viveram um cenário catastrófico. 

Os protestos foram muitos, mas a opção, que tem a chancela da Administração do Metro, do PS, então no governo e na autarquia lisboeta, teimou em fechar a cidade à população da periferia. O resultado é a transformação do Metro de Lisboa numa solução de mobilidade para o turista, dando prioridade aos interesses dos grandes fundos imobiliários que vêm transformando Lisboa numa cidade de turistas, com uma população residente cada vez mais reduzida e envelhecida. Com pouco mais de meio milhão de pessoas, Lisboa vai-se transformando numa cidade de média ou pequena dimensão. É a migração pendular, sobretudo da periferia de Lisboa que lhe dá a dimensão cosmopolita. 

Os Censos de 2021 são claros: a cidade que teve 807 mil residentes em 1980 está, neste momento, reduzida a 547 mil. Mostram como a maioria da população ativa, que diariamente põe em funcionamento hospitais, escolas, ministérios, bancos, restaurantes dando vida e dimensão cosmopolita a Lisboa é fruto da migração pendular. 

Moita, Seixal e Odivelas são três dos concelhos cujo nível de emprego corresponde a menos de metade da população residente ativa empregada, ao contrário de Lisboa e Porto que, como refere o INE, se destacam entre 40 municípios, localizados de forma dispersa no país, em que o número de empregados é superior à população residente empregada. Isto é, no caso da capital, os movimentos pendulares que fornecem a Lisboa trabalhadores e estudantes estão e vão crescer, e uma das entradas, para além de Sintra e Cascais, são Odivelas e Loures. 

A Linha Circular olha para o turismo em prejuízo desta população, sobretudo da que reside no braço norte da Área Metropolitana de Lisboa, mas também desistindo da população da Linha do Estoril, cuja ligação ferrovia/Metro beneficiaria com a extensão da Linha Amarela do Rato até Alcântara.

A opção da Linha Circular tem muitas outras consequências. Ao prolongar o tempo de viagem casa-trabalho/escola-casa, convida-se esta população a usar viatura particular, fazendo disparar os níveis de congestionamento rodoviário e de emissão de gazes poluentes. Somar mais um transbordo num trajeto de metro significa retirar pelo menos meia hora diário à família. 

A contestação teve vários momentos e expressões. Por proposta do PCP, a Assembleia da República aprovaria em 2019, uma alteração ao Orçamento de Estado, mas nem isso demoveria o governo PS que adjudicou a empreitada. Em fevereiro de 2020 o então presidente da Câmara Municipal de Loures, Bernardino Soares, escreveria uma carta ao então primeiro-ministro, pressionando-o a avançar com a expansão do Metro para Loures aproveitando o quadro comunitário. Em abril de 2020 a Câmara Municipal de Lisboa aprovaria, por proposta do PCP e votos a favor de CDS, PSD e BE, uma moção contra o projeto da Linha Circular. Entretanto, e dado o argumento do risco de se perder os 83 milhões de euros de fundos Europeus destinados a esta obra, o deputado da CDU no Parlamento Europeu, João Ferreira questionou a Comissão Europeia que, em resposta, garantia que as verbas em causa, poderiam ser transferidos para outros projetos. Face aos constrangimentos das obras da Linha Circular, a Junta de Freguesia do Lumiar reuniria com o Ministro Duarte Cordeiro e este declararia que a Linha em Laço era uma opção. Recorde-se que a solução da Linha em Laço permite que a Linha Circular conviva com a Linha Amarela tal como está. 

O Governo e a autarquia de Lisboa mudaram de cor partidária, mas ainda não foi travada a Linha Circular no respeito pelas posições políticas assumidas anteriormente e pelas populações da periferia que trabalham e estudam em Lisboa.

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