Já ninguém nega que vivemos e trabalhamos num país onde os baixos salários e as baixas pensões imperam. Há, até, aqueles que se passeiam pelos meios de comunicação social desfiando as suas boas intenções e manifestando os seus sentimentos caritativos para com a difícil situação em que vive grande parte da população.
Mas o discurso altera-se quando se passa para a discussão das soluções e caminhos a seguir para garantir um futuro para o país. Aí, é vê-los a repetirem o discurso das “inevitabilidades”, “impossibilidades” e da “paciência” que todos têm de ter (leia-se: quem trabalha e trabalhou), para um dia, sempre mais à frente, poderem ver a luz ao fundo do túnel.
Na actual situação que vivemos, decorrente da anunciada dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições para 10 de Março do próximo ano, não faltam essas mesmas vozes a procurar convencer os mais distraídos de que este não é o tempo de confrontos, de exigências, de reivindicações. Para esses – os protagonistas das opções políticas que nos trouxeram até à situação que hoje vivemos, façam eles parte do actual governo, ou dos partidos da direita que ora passivamente, ora activamente, convergiram nessas opções – o melhor era que todos ficássemos sossegados.
Mas não ficamos. Os trabalhadores sabem que é possível um outro caminho. Porque existe riqueza suficiente, produzida por quem trabalha, para garantir uma vida digna a todos os que cá vivem e trabalham. Porque é possível evitar a degradação e garantir um futuro para os serviços públicos e funções sociais do Estado, assim se invista nos mesmos e se valorizem os seus trabalhadores.
Dizem-nos que não há dinheiro? Então e os dados da economia que abrilhantam a imagem do país nos corredores de Bruxelas? Então e os lucros dos grandes grupos económicos anunciados com pompa e circunstância? Por exemplo, no 1º semestre, 20 grandes grupos económicos e financeiros, arrecadaram lucros líquidos superiores a 25 milhões de euros diários! Entre estes 20, 5 dos maiores bancos do país enchiam os cofres com lucros líquidos diários de 11 milhões de euros. É de referir que estes valores tiveram um crescimento de mais de 52% entre 2021 e 2023.
Ou seja, no crescendo dos lucros de uns poucos, por via da exploração de quem trabalha, da especulação e do tanto que temos pago pelos bens essenciais – alimentação, energia, combustíveis, bem como pelo aumento nas rendas e na prestação ao banco – estão as dificuldades e os sacrifícios dos trabalhadores, dos reformados e pensionistas, das famílias, dos jovens.
A propaganda que procuram impingir, pintando um país que a maioria não reconhece no seu dia a dia, de grandes sucessos e desenvolvimento, choca com a dura realidade que revela que mais de 70% do emprego criado é com vínculos precários e que 2 em cada 3 trabalhadores recebem um salário bruto até 1000€; que 43% recebem um salário bruto até 800 euros; que cerca de 1 milhão de trabalhadores recebe o Salário Mínimo Nacional – 760 euros que se traduzem em 667 euros a cada final do mês.
É este o nível de desigualdades que urge inverter.
É urgente aumentar significativamente os salários para todos os trabalhadores, para melhorar de imediato as condições de vida dos trabalhadores e garantir o futuro do país. É necessário pôr fim à especulação que beneficia os grandes grupos económicos, controlar e reduzir os preços de bens e serviços essenciais, taxar os lucros das grandes empresas, pôr os lucros da banca a suportar os aumentos da taxa de juro dos créditos da habitação e alterar o rumo da política que tem vindo a ser seguida e que empurra um número crescente de trabalhadores para a pobreza.
A luta tem-se travado todos os dias, nos locais de trabalho e serviços, em todos os sectores, em todo o país. São lutas cujo tempo de antena é diminuto ou mesmo nenhum, mas que têm a força e o poder de alterar a correlação de forças a favor de quem trabalha, de garantir melhores salários, direitos e condições de vida.
É com estas lutas diárias, das mais pequenas às de maior envergadura, com confiança e determinação na força colectiva, que se abre o caminho para acabar com as injustiças e desigualdades sociais.
No momento em que escrevo este texto, decorre a discussão das propostas de alteração ao Orçamento do Estado (OE). Um OE que não responde aos problemas e não serve os trabalhadores nem o país, cuja opção política é de manter o modelo de baixos salários com ainda maior perda de poder de compra para os trabalhadores, nomeadamente para os da Administração Pública. Por outro lado, deixa intocados os grandes grupos económicos, oferecendo-lhe mais possibilidades para continuarem a acumular riqueza. E enquanto assumem como prioridade a criação de excedentes para abater a dívida respondendo às imposições da UE, faltam nas medidas urgentes para responder aos salários, às pensões, à saúde, à justiça, à educação, à habitação.
Neste tempo que agora corre, os trabalhadores estão em luta. Por um outro OE, que responda aos problemas, que valorize o trabalho e os trabalhadores, questão central para o desenvolvimento do país, por uma política alternativa em que os interesses nacionais se sobreponham aos interesses do grande capital.
O que se coloca aos trabalhadores hoje, como ontem e nos dias que estão para vir, é a necessidade de intensificar a acção e a intervenção organizada em torno das suas justas reivindicações, pelo direito a trabalhar e a receber um salário que permita viver com dignidade, pela distribuição da riqueza por quem a produz e pela defesa e investimento nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado.