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Os outros caminhos do western com o “pistoleiro romântico” e sonhador

“Em 1880, no Sudoeste, a diferença entre a morte e a glória estava a uma fracção de segundos.” Isso consagrou homens como Ringo, que, no início de “The Gunfigther”, em português “O Pistoleiro Romântico”, vemos a atravessar a cavalo terras áridas e isoladas dessa região americana. Jimmie Ringo (Gregory Peck), tão icónico como Wyat Earp e Billy the Kid, é o mais rápido a puxar de uma arma.

Estamos no território do western em “O Pistoleiro Romântico”, filme de 1950 de Henry King. Ringo chega a uma pequena cidade. Estas perdidas localidades são, juntamente com os pistoleiros, figuras comuns a este género cinematográfico. Quando se vêem vários filmes do mesmo género (sobretudo em projecção), como agora é possível com os ciclos que a Cinemateca Portuguesa lhes está a dedicar (“Era uma vez o western”), é interessante verificar que essas personagens e espaços simbólicos são utilizados pelos autores para a desconstrução da imagem e funções que deles fazemos. “O Pistoleiro Romântico” é paradigmático dessa outra concepção dos elementos do western. O heroi não é assim tão poderoso. Já não quer estar nesse lugar lendário, onde todos o continuam a colocar.

No saloon onde descansa antes de prosseguir jornada, um jovem ousa desafiar Ringo. Quer verificar a sua rapidez no manejo da arma. Ringo avisa o rapaz. E existem consequências para o miúdo pistoleiro, uma vez que arremessou a pistola em primeiro lugar. Outra lei do universo western: os disparos mortais de auto-defesa absolvem o atirador. Mas Ringo tem muitos inimigos, e este gesto vai persegui-lo.

O mais rápido pistoleiro precisa de sossego

Ringo continua o seu caminho. Quer que o deixem em paz. Mas as pessoas tendem a testá-lo. Ringo é agora um pistoleiro com outros objectivos. Regressa a outra cidade, de manhã cedo. Cayenne é o seu destino final. E dirige-se ao saloon. Não espera o duelo final com um seu rival. Não quer jogar às cartas, nem embebedar-se. Também não está em fuga. Ringo senta-se numa mesa isolada, e espera. O empregado do bar avisa o xerife da chegada de Ringo. E o grande acontecimento é a presença do pistoleiro mais rápido em Cayenne.

São velhos conhecidos, Ringo e o marshall. Este último deixou o lado marginal, tendo chegado a ser companheiro de Ringo. Ringo quer refazer a sua vida. A sua serenidade é maturidade, e revela ainda cansaço face àquilo que dele perpetuam: um homem duro e implacável. Mas ele tem um objectivo, e fica ali no saloon. Sossegado, e também um pouco ansioso.

Entretanto, as crianças fugiram da escola. Vão para a porta do sítio onde o lendário homem se escondeu. Este entusiasmo contrasta com a ameaça de um homem que quer matar Ringo. Ringo desfaz isso, está atento aos perigos. Não deixa de ser o pistoleiro que é. Mas na sua cabeça está o reencontro com a mulher que deixou para trás. Aquela é a sua cidade. É ali que volta para assentar.

Esta reversão do mito do pistoleiro é interessante. Dá humanidade à personagem, que é muito mais do que a imagem que dele todo o Oeste foi, ao longo dos anos, solidificando.

A humanidade dos duros

“O Pistoleiro Apaixonado” é um western pleno de humanidade, sobre alguém que não consegue ser um homem com fragilidades, desejos e intenções pessoais. O próprio filho adora a personagem Ringo, sem saber que se trata do pai. Que destino pode ter aquele que é considerado como o mais rápido pistoleiro? O que todos se esquecem é que qualquer homem é um sonhador. Este é agora um pistoleiro apaixonado e um sonhador. Características peculiares no carácter de um protagonista, quando, regra geral, tomamos o western pelas suas ideias mais comuns: um conflito entre cowboys e índios, com um duelo no final algures numa remota cidade.

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