Consideramos que trabalhar em constante articulação implica uma clara definição do papel de cada um, num contínuo respeito pela função do outro. Neste sentido, procurámos ouvir alguns agentes educativos, desde a creche ao 1º ciclo, para construirmos esta reflexão.
Através do olhar da maioria dos docentes, a cooperação com o psicólogo e o diálogo entre as duas áreas, confere-lhes confiança no trabalho que desenvolvem diariamente, pois sentem-se ouvidos e apoiados. Os psicólogos oferecem uma visão diferenciada, objetiva e distanciada, alertando “para aspetos que passam despercebidos no meio da rotina”. Tal permite, não só a existência de momentos de reflexão conjunta promotores de partilha de conhecimentos, estratégias e diferentes formas de pensar, como também o desenvolvimento de competências pessoais e profissionais imprescindíveis para a prática pedagógica e superação de determinados desafios, relativos às crianças, às famílias e, até mesmo, aos colegas de equipa. Assim, possibilita a compreensão das “diferenças […] e ver para além do óbvio”.
A presença frequente do psicólogo em sala é sentida como uma mais-valia para o trabalho da escola. O facto de poderem aprender com ele ajuda não só a gerir questões do grupo ao nível das emoções, do comportamento e da aprendizagem, como também a acalmar as suas inseguranças enquanto profissionais. “O que me faz sentido é alguém que possa estar connosco descomprometidamente, sem estar muito preocupado com ter que aplicar testes”.
O impacto que alguns projetos realizados em sala tem nas aprendizagens é valorizado, pois consideram importante as crianças terem oportunidade de exprimir o que sentem num espaço seguro e poderem assim construir uma relação próxima entre si, de empatia e preocupação com o outro. Neste sentido, uma docente de 1º ciclo mencionou a “Roda de Conversas”. Este projeto “(…) surgiu porque nesse ano tinha vários miúdos com questões pessoais e emocionais, mas que depois no grupo fazia uma panela de água a ferver a toda a hora. (…) Eu acho que permitiu aos miúdos criarem uma relação entre grupo muito próxima e especial. Mesmo que eles não fossem grandes amigos lá fora, compreendiam as questões do outro e isso foi muito importante também na relação com a aprendizagem”. Para além disso, valorizam também os projetos realizados com o objetivo de estimular a aprendizagem da leitura e escrita e reforçam a necessidade de termos mais tempo para estar com as crianças, fazer observação e estar presente em diversos momentos com as famílias.
No trabalho com as famílias, o psicólogo é visto como facilitador “no estreitamento de laços, partilha de informação e estratégias” a definir em conjunto de forma a estarem adequadas às características individuais das crianças, às dinâmicas familiares e ao contexto escolar. A presença do psicólogo nas reuniões entre os docentes e os pais é vista como trazendo segurança e conforto às famílias, principalmente quando há a necessidade de complementar a informação transmitida.
Ainda que o foco do nosso trabalho esteja na colaboração com os agentes educativos que trabalham de forma direta com as crianças, é também essencial que estas conheçam este recurso. Para tal, é necessário que o psicólogo esteja disponível para ouvir e estar verdadeiramente com as crianças no seu dia-a-dia na escola, desenvolvendo com elas uma relação de confiança e proximidade. Acreditamos que só com base nesta estreita relação será possível desenvolver uma prática que abra espaço para que cada criança ou grupo possa, por iniciativa própria, procurar-nos consoante as suas necessidades. Torna-se, então, mais fácil compreendê-las e delinear objetivos de intervenção que as possam ajudar.
Em suma, a visão do psicólogo em contexto escolar como alguém que apenas trabalha de acordo com as referenciações que recebe, e dirige a sua intervenção exclusivamente neste sentido, sobretudo em gabinete e com um foco mais burocrático, tem vindo a ser desconstruída. Tem sido substituído pelo tempo passado nas salas, construção da relação com os profissionais que trabalham diariamente com as crianças e realização de projetos que estimulam competências fundamentais. O trabalho do psicólogo em contexto escolar deve focar-se na intervenção com todos e investir na prevenção, ao invés da remediação. É motivador perceber que esta evolução que tem vindo a acontecer, e que desejamos que se torne cada vez mais evidente, ficou espelhada nos testemunhos que recolhemos. Destacaram a relação, proximidade, disponibilidade, o tempo passado connosco e em sala como os aspetos mais importantes que os fazem sentir-se muito apoiados, e isso só demonstra que estamos a ir pelo caminho certo. Ainda há muito para evoluir, mas acreditamos que todos juntos chegaremos lá.
Vanessa Xavier, Raquel Baltazar, Maria Inês Oliveira, Filipa Carqueijeiro, Sara Paulus, Carolina Costa e Mariana Mouquinho, Psicólogas d’A Voz do Operário