Serão precisos 4 milhões de subscritores de uma petição para exigir um referendo sobre o aumento da idade da reforma em França e isso não parece ser problema. Depois será o Tribunal Constitucional a pronunciar-se o que, caso aprove, será a primeira vez que acontece. Mas, ainda assim, e apesar da violência de alguns protestos, o respeito pelas regras democráticas é mais considerado na rua que no Palácio do Eliseu, acusam os que protestam.
Em França a idade da reforma situa-se nos 62 anos, idade limite que o Presidente decidiu alterar para os 64. Como a contestação era muita, e a aprovação no Parlamento não estava garantida, já que apesar da passagem da legislação no Senado, na Câmara Baixa tudo indicava que iria ser reprovada, Macron decidiu então deitar mão de um preceito constitucional de 1958, o artigo 49.3, que permite ao Executivo da senhora Élizabeth Borne, aprovar uma lei sem ter de ser votada no Parlamento. Ora esta fuga à regra democrática deixa o poder francês em maus-lençóis, já que Macron decidiu fugir ao escrutínio democrático. Como nas autocracias, quando a democracia interfere na decisão política, contorna-se o processo democrático. E é disso que exatamente a oposição acusa Macron, e é isso que a oposição quis dizer quando cantou a Marselhesa em pleno Parlamento.
A justificação apresentada por Macron prende-se com aquilo a que designa de sustentabilidade do sistema a muito longo prazo. Já que, mesmo na pior das hipóteses, mantendo-se diferença entre receitas e despesas do sistema, durante os próximos 20 anos, essa sustentabilidade mantém um rácio de 1,5 contribuintes para cada reformado. É, pois, uma previsão de défice que a primeiro-ministro, Élizabeth Born e o seu ministro das Finanças, Bruno Le Maire fazem, que a evolução do sistema, que depende de outras variáveis, pode não confirmar.
A regressão social que representa esta medida, na sua substância, não é a única razão do protesto levado a cabo pela oposição a Macron e, sobretudo pelos sindicatos. A forma como o presidente francês alcançou esta mudança da idade da reforma, bem como a “arrogância” com que o terá feito, abre outro patamar à luta nas ruas que agora está a ser engrossada por milhões de jovens estudantes das escolas e universidades.