Anunciaram os jornais que a partir do segundo semestre de 2022 arrancará entre nós o projeto-piloto do Número de Identificação do Prédio, tido por alguns como “o início de uma nova etapa na história da propriedade em Portugal”.

Trata-se do fortalecimento de um instrumento legal que permitirá aos proprietários de terrenos rústicos sem documentação inequívoca sobre o estatuto de posse plena ou sem que as suas propriedades estejam convenientemente referenciadas geograficamente, ter agora oportunidade de esclarecer situações e atualizarem os respetivos registos.

A ideia não é nova pois qualquer prédio, rústico ou urbano, já está hoje sujeito a um registo matricial, mas não é difícil entender que a criação de um número único de identificação conterá mais informação do que o nome do ou dos proprietários, a área, a forma e as confrontações e certamente dará acesso a informação mais vasta que no seu conjunto possa servir de base a decisões políticas globais no campo, por exemplo do ordenamento do território e do combate aos incêndios. 

Para que não se trate somente de um alimentador de estatísticas. 

A identificação através de um número, muito mais precisa do que a identificação através de um nome, tem vindo a ser usada desde há muito e aplicada tanto a pessoas, como a animais ou a objetos instrumentais, tanto quando assume a forma de cartão de cidadão, carta de condução, boletim de saúde, registo (no caso de alguns animais com chip ou fotografia), licença (de uso de porte de arma) ou livrete (de veículo automóvel).

Detenhamo-nos sobre este último: existe um e um único para cada veículo motorizado que possa circular em qualquer estrada, rua ou caminho do país e dele consta pelo menos o tipo de veículo, o modelo, o fabricante ou marca, o combustível utilizado, a cilindrada e a cor ou cores de que é pintado, as suas dimensões e a sua capacidade de uso (carga ou passageiros). Nenhuma destas características pode ser alterada sem o aval de entidades competentes e o veículo está sujeito a avaliações periódicas, sem as quais não poderá circular.

Põe-se então a questão da não existência nem da previsível existência de um número que conduza à identificação de todos os fogos colocados no mercado imobiliário urbano de forma a que quem aluga ou compre conheça inequivocamente as características do que vai alugar ou comprar. Como quando compra ou aluga um automóvel deverá ter consciência do que consta no respetivo livrete e agir e beneficiar do que lá está. 

Seria uma espécie de ficha, historial ou “boletim de saúde” para cada casa, regulamentada pelo Estado e fiscalizada pelas Autarquias onde constassem as características do fogo e os níveis de renda ou custos admissíveis e isto para que as rendas e os custos de um tugúrio, de uma barraca ou de uma casa habitável não estejam sujeitos às mesmas regras de funcionamento do mercado imobiliário, qualquer que seja a sua qualidade: …pedir os valores máximos alcançados no mercado e depois esperar (especular) até que apareça alguém que, em desespero, possa dar o que lhe é imposto.

Num sistema de regulamentação-tabelamento (à semelhança do que já acontece com os transportes, com a saúde pública, com a água, a energia e as portagens), garantindo ao investidor o retorno do investimento e um lucro razoável, poderia ser dado ao utente a possibilidade de a escolha dentro do binário recursos-necessidade e ao Estado, para além da construção direta que as circunstâncias impõem, melhor gerir uma política de auxílio às famílias que aliás também se impõe.

Resta perguntar: quem tem medo da regulamentação e do tabelamento no que diz respeito ao direito à habitação? 

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