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Antifascismo

O dia em que os soviéticos abriram as portas do inferno de Auschwitz

Quando passam 75 anos da libertação do campo de extermínio nazi de Auschwitz pelas tropas soviéticas, as palavras de Primo Levi parecem continuar atuais num mundo cada vez mais avesso à memória histórica: “Existem monstros, mas são demasiado poucos, em número, para serem realmente perigosos. Mais perigosos são os homens comuns, os funcionários prontos a acreditar e a agir sem fazer perguntas”.

Foi a 27 de janeiro que soldados do Exército Vermelho abriram os portões de Auschwitz, na Polónia, depois de fazerem recuar a máquina de guerra nazi num avanço que só acabaria em Berlim com a rendição incondicional dos homens de Adolf Hitler. Depois de Dachau, Sachsenhausen, Buchenwald, Flossenbürg, Mauthausen e Ravensbrück, Auschwitz foi o sétimo campo de concentração construído pelos nazis.

Os arredores da pequena cidade polaca de Oswiecim serviram de espaço para acampamentos de vários tamanhos: além do campo principal (Auschwitz I), o enorme campo de extermínio de Birkenau (Auschwitz II), onde estavam localizados os crematórios, e campos externos menores, havia ainda os campos de trabalho forçado de Buna e Monowitz.

Foi na primavera de 1942 que Auschwitz foi ampliado tornando-se numa máquina de extermínio sistemático. Mais de 1 milhão de pessoas, entre judeus, comunistas, homossexuais, ciganos e pessoas com deficiência, foram objeto de assassinatos de proporções inimagináveis com métodos bárbaros como os infelizmente célebres duches que não eram mais do que câmaras de gás. Para além de campos de concentração, houve outros seis complexos de extermínio como Auschwitz: Chełmno, Bełżec, Sobibór, Treblinka, Majdanek e Trostenets. Entre 6 a 11 milhões de seres humanos terão sido assassinados pela barbárie nazi num processo de extermínio que ficou conhecido como Holocausto.

De acordo com uma investigação do Público, estima-se ainda que durante a 2.ª Guerra Mundial dezenas de portugueses que moravam em França foram presos, colocados em campos de internamento e deportados, posteriormente, para campos de concentração na Alemanha ou na Polónia. Alguns acabaram por ser transferidos para outros campos, na Áustria ou em França. Muitos deles estavam filiados no Partido Comunista Francês e faziam parte das estruturas clandestinas da Resistência contra a ocupação nazi.

Foi o caso de Luiz Ferreira que, de acordo com a ficha do campo de concentração, media 1,58 metros, era louro, esguio, de olhos castanhos e não tinha todos os dentes, descreve o Público. A ficha médica indica ainda que tivera um acidente em 1925, que lhe deixara a mão esquerda danificada e que, em 1937, sofrera uma fratura na parte inferior da coxa direita, classificada como “ferimento de guerra”, o que apontava para a sua presença na Guerra Civil de Espanha (1936-1939). O nome de Luiz Ferreira aparece ainda numa lista de oito sobreviventes portugueses do campo de Buchenwald, feita pelos Aliados após a libertação.

Ainda de acordo com a investigação, Luiz começou a sua vida em França, sozinho, não se sabe exactamente em que ano, mas em 1932, conforme escreveu numa das notas deixadas à sobrinha, “já militava” no Partido Comunista Francês. Foi sindicalista até morrer, em 1991. Em 1936, partiu como voluntário para a Guerra Civil de Espanha e por lá ficou até 1938, usando o nome de código Simon. Nas notas que deixou a Amélia, uma foi colocada junto à fotografia do Coronel Fabien (Pierre Georges), morto em 1944 na frente da Alsácia, com a indicação: “Foi combatente comigo na 12.ª Brigada (Madrid 1938).”

O Público refere ainda outra portuguesa que participou na Resistência. Mariette Barbosa tinha apenas 17 anos quando a guerra rebentou, mas em 1944 a jovem portuguesa de 22 anos, que residia, então, em Saint-Fons, estava já envolvida no combate ao nazismo. Foi detida e encarcerada em vários campos de concentração.

As atrocidades cometidas nos campos de concentração e extermínio chocaram os soldados soviéticos que conseguiram chegar a Auschwitz depois de conseguirem suster a forte ofensiva alemã. Para se ter em conta a dimensão do peso do Exército Vermelho na derrota do nazismo, na União Soviética, a Alemanha perdeu não menos de 10 do total de 13,5 milhões de soldados mortos, feridos ou prisioneiros durante toda a guerra. Os soviéticos foram responsáveis por 90% dos alemães que morreram durante a 2.ª Guerra Mundial.

Invasores e libertadores não são iguais

A Federação Internacional de Resistentes (FIR), organização que reúne estruturas de vários países de sobreviventes das perseguições fascistas e de combatentes contra a barbárie nazi e todos os antifascistas e suas organizações, incluindo a União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), divulgou uma nota em que critica e rejeita uma resolução aprovada em setembro pelo Parlamento Europeu (PE) que equipara e condena nazi-fascismo e comunismo. A iniciativa foi apresentada por iniciativa dos países bálticos (Estónia, Letónia e Lituânia) e da Polónia. O texto da resolução, considera a FIR, é “uma reminiscência ideológica dos piores tempos da Guerra Fria”, que falsifica as causas da II Guerra Mundial e confunde “opressores e oprimidos, carrascos e vítimas, invasores e libertadores”. A FIR e as organizações que a compõem “dizem não a tais falsificações históricas”, num momento em que “há um crescente perigo de fascismo, racismo e nacionalismo”. Nesta declaração, a estrutura europeia com associações em mais de 20 países da Europa e em Israel, evocou as palavras do escritor Thomas Mann, Prémio Nobel da Literatura, que avisou em 1945: “Colocar o comunismo russo no mesmo plano moral do nazi-fascismo, porque ambos são totalitários, é, na melhor das hipóteses, superficial e, na pior, fascismo. Quem insiste nesta equiparação pode considerar-se um democrata mas, na verdade e no fundo do seu coração, já é um fascista e certamente combaterá o fascismo sem sinceridade e com hipocrisia, deixando todo o seu ódio para o comunismo”.

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