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Racismo

Quem é Mumia Abu-Jamal, encarcerado há 40 anos?

O jornalista e revolucionário é alvo de inúmeras campanhas pela sua libertação do sistema prisional norte-americano.

O nome Wesley Cook não será familiar para a maior parte das pessoas. Este afro-americano, nascido em 1967, em Filadélfia, viveu, durante décadas, no corredor da morte e é conhecido como Mumia Abu-Jamal. Jornalista e revolucionário, é alvo de inúmeras campanhas pela sua libertação do sistema prisional norte-americano. 

Foi na madrugada deste dia, há 40 anos, que foi detido nas ruas de Filadélfia, acusado de matar o agente Daniel Faulkner.

Era Wesley Cook até ao dia em que um professor de língua suaíli o baptizou de Mumia,  o nome de alguns dos combatentes quenianos na sua guerra pela independência, contra a Grã-Bretanh. Estávamos em 1968 e o Partido dos Panteras Negras tinha sido criado dois anos antes. Foi só mais tarde que adoptou o apelido de Abu-Jamal, em árabe “pai de Jamal”, em homenagem ao seu primeiro filho.

Logo aos 14 anos, foi espancado por um polícia por protestar num comício de um candidato racista. Mais tarde, junta-se aos Panteras Negras como um dos responsáveis pela informação e ligação aos órgãos de comunicação social. É nesta altura que chama a atenção do FBI que, através do programa ilegal COINTELPRO, vigia e infiltra a organização. Acaba por regressar à escola secundária para terminar os estudos mas é castigado por encabeçar protestos que exigiam que o espaço educativo tivesse o nome do revolucionário afro-americano Malcolm X.

Com os principais dirigentes dos Panteras Negras assassinados ou detidos, e sob um permanente assédio policial, Abu-Jamal dedica-se ao jornalismo, sobretudo na rádio. É eleito presidente da Associação de Jornalistas Negros de Filadélfia. Em 1981, complementava esse trabalho com o de taxista, duas noites por semana.

Foi precisamente nesse ano, a 9 de Dezembro, que foi detido pelas autoridades. Conduzia o táxi quando viu o seu irmão, Billy Cook, ser parado pelo agente Daniel Faulkner. Segundo a versão oficial, e que norteou a acusação e consequente condenação, teria sido Abu-Jamal a balear o polícia que morreu no momento. Contudo, anos mais tarde, houve uma série de declarações e factos que apontaram para evidências em contrário. Desde logo, a arma de Abu-Jamal nunca foi testada para verificar se teria, de facto, disparado; as suas mãos nunca foram examinadas em busca de vestígios do disparo e as balas da arma do jornalista não coincidem com as que mataram Faulkner. Das três testemunhas, uma viria a admitir ter mentido sob pressão policial, outra desapareceu no meio de provas de que também estaria sob coacção e a terceira, que inicialmente disse à polícia ter visto o assassino fugir, viria também a alterar o seu testemunho. Outros testemunhos que afirmavam ter visto um terceiro homem fugir foram minimizados.

O juiz, Albert Sabo, era um antigo membro do sindicato policial e pertencente à Ordem Fraternal da Polícia, conhecida por favorecer os procuradores. O próprio anulou a autorização que Abu-Jamal tinha obtido para se representar a si próprio, excluiu-o de grande parte do seu próprio julgamento, e presidiu à selecção do júri, no qual a maioria dos candidatos negros foi removida. Um estenógrafo do tribunal ouviu Sabo afirmar a um colega: “Vou ajudá-los a fritar o preto”.

É em resultado deste processo envolto em muitas dúvidas, irregularidades e discricionariedades que Mumia Abu-Jamal acabou condenado à morte, uma decisão imediatamente contestada e que espoletou movimentos de solidariedade pelo mundo inteiro, incluindo em Portugal, exigindo um julgamento justo para o activista afro-americano. Só em 2011, depois de três décadas no corredor da morte, é que o procurador do Ministério Público, com o apoio da família de Daniel Faulkner, anunciou a retirada da pena de morte, substituída por prisão perpétua sem direito a perdão. Esta sentença foi confirmada pelo Supremo Tribunal da Filadélfia, dois anos depois.

Sem um novo julgamento, Mumia Abu-Jamal, agora com 67 anos, está preso há 40 anos, mais 13 do que Nelson Mandela. Contudo, as barras da prisão não o conseguiram calar. Manteve o seu ofício de comunicar, com artigos publicados em jornais, participando em programas de rádio e com a publicação de livros. Mantém uma colaboração regular com o jornal marxista alemão Junge Welt e tem artigos publicados na página de Fidel Castro, dirigente comunista que sempre admirou e defendeu. Angela Davis, Noam Chomsky, Chris Hedges, Cornel West, Tom Morello, Maya Angelou, Spike Lee, Gunter Grass, Susan Sarandon e Paul Newman são algumas das muitas personalidades que se mostraram solidárias com Mumia Abu-Jamal ao longo destas quatro décadas.

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