Nos 50 anos do 25 de Abril e na luta constante e necessária pelos valores da liberdade, fraternidade e igualdade, vale a pena tentar encontrar e rever o filme “Inês vai morrer”, de 1976, realizado por Giuliano Montaldo. Adaptação de um dos mais importantes livros do neo-realismo italiano, “Inês vai morrer” é uma obra de resistência, que coloca no centro a força de uma mulher na luta contra a invasão alemã.
Agnese (nome traduzido por Inês, em língua portuguesa) é uma lavadeira analfabeta, mulher do povo, que vive com Palita, o marido doente. A mulher de meia-idade, extraordinariamente interpretada pela actriz Ingrid Thulin (que conhecemos de tantos filmes de Ingmar Bergman), não fica indiferente ao fugitivo que aparece quando está a trabalhar junto ao rio. Avisa o marido, que lhe pede que traga o guerrilheiro para casa. Isto acontece sob o olhar da família vizinha, que acaba por denunciar o casal. Palita, militante do Partido Comunista, é levado pelos fascistas. Não durará muito tempo. Agnese sabe-o.
Agnese não tem mais ninguém. Esta injustiça desencadeia a sua revolta; começa as suas acções de resistência. Torna-se intermediária do partido na luta pela liberdade. Faz quilómetros pelos campos ao volante da sua bicicleta; visita os que estão escondidos em ruínas e abrigos, vivendo na clandestinidade. Entrega-lhes comida, conversa com eles, e vai-se apercebendo de um cenário sobre o qual o marido nunca lhe tinha falado (provavelmente para a proteger). Entretanto, Ciro, um rapaz preso com o Palita, consegue evadir-se. Vai ter com Agnese, e confirma a morte do seu marido. Ciro não se lembrar da aldeia onde ficou o corpo de Palita. A dor silenciosa de Agnese aumenta: é proporcional ao seu voluntarismo para com todos os que tentam combater a invasão alemã.
A mãe-coragem na resistência contra o fascismo
A traição dos vizinhos intensifica-se. Recebem soldados nazis em casa, que matam por maldade o gato de Agnese. A raiva e a violência tomam conta da protagonista, e o inimigo acaba por incendiar da sua casa. Agnese junta-se à vida nómada dos homens da resistência. A sua vida passa a confundir-se na íntegra com aquilo que os outros precisam e lhe pedem. Agnese é a única mulher entre estes homens de várias idades. Todos gostam e precisam dela; tratam-na por Mama. A certa altura, um jovem, Tom, recebe a namorada, a quem assassinaram irmão e pai. Agnese toma conta da rapariga, mas esta acaba por colapsar e partir; não aguenta a luta anti-fascista. A união entre os partigiani nunca colapsa.
As condições agravam-se: falta comida, os alemães atacam como podem. Os guerrilheiros resistem como podem, longe de casa e sem saber o que o futuro próximo ou longínquo lhes reservará. A luta pela liberdade é o que os move a continuar, sempre que um abrigo é incendiado, ou quando a casa onde estão é inundada pela cheia provocada pelo inimigo. Existe o comandante, que esteve na frente russa, a quem todos ouvem, e que confia sobretudo em Agnese.
Agnese torna-se no centro da resistência; uma mãe-coragem que dá cama, comida e alento àqueles homens. Isto é evidente na visita à casa alagada onde estão: a sua presença fá-los recuperar o ânimo. Entre os guerrilheiros, há quem enlouqueça, quem morra numa emboscada, quem seja trucidado por minas pessoais. Como diz Agnese, sempre que um de nós desaparece, aparecerá outro no seu lugar. Nenhum deles acredita no fim da resistência, porque a liberdade tem de ser conquistada, mesmo que isso custe a vida. A protagonista sabe-o desde o início. Num posto de vigia, quando Agnese se encaminha para uma nova missão, um comandante alemão reconhece-a – trata-a por Mama. Depois, ficamos com seu corpo perdido na aridez da paisagem de um país aprisionado. Agnese permanecerá como símbolo maior da resistência corajosa de uma mulher contra o fascismo, na luta pela liberdade.