Nas últimas eleições autárquicas, a CDU perdeu a Câmara Municipal de Almada por pouco mais de 300 votos. Pela primeira vez desde as primeiras eleições autárquicas em democracia, o concelho experimentou uma gestão diferente e envolta em polémicas constantes. O PS apresentou, então, a ex-atriz e deputada Inês de Medeiros à presidência da autarquia sem esperar, contudo, roubar Almada aos comunistas e verdes. Foi o BE que lançou o desafio. “Tirar a maioria absoluta à CDU para que o executivo de Almada se abra a uma participação plural da esquerda”, anunciava Joana Mortágua, que agora se volta a recandidatar.
Com Inês de Medeiros à frente da câmara não houve qualquer acordo ou abertura à esquerda, bem pelo contrário. O PSD alcançou 14% dos votos e a eleição de dois vereadores que formaram uma coligação com o PS para os seguintes quatro anos. Para além da atual presidente da autarquia, que se volta a candidatar pelo PS, também Nuno Matias repete pelo PSD.
É a CDU que traz um novo rosto para a contenda eleitoral com o objetivo de recuperar Almada. Maria das Dores Meira, que apresenta no currículo a presidência da Câmara Municipal de Setúbal durante vários mandatos, encabeça este projeto.
Quatro anos de polémicas
Logo que soube da surpreendente vitória, Inês de Medeiros anunciou que passaria a ir trabalhar para Almada de cacilheiro. Passada a febre da vitória, a autarca do PS nunca pôs esse plano em prática. Mas pôs outros.
Em 2019, deu polémica o acordo assinado com o coreógrafo Paulo Ribeiro para a criação da Casa da Dança de Almada por estar prevista a instalação da nova estrutura na Casa da Juventude ‘Ponto de Encontro’, em Cacilhas, usada por uma dezena de grupos locais e berço da produção artística almadense há 30 anos.
Sem nunca esconder que o plano para Almada passaria por replicar o que chamou de “sucesso de Lisboa”, a turistificação do concelho passou a ser uma prioridade. Foi nessa estratégia que se inseriu a decisão, em 2020, de pavimentar uma estrada em cima de uma zona dunar na Fonte da Telha. É um dos paraísos naturais que se encontra em área de paisagem protegida e donde se pode observar a imponente arriba fóssil. O anterior pavimento era empedrado com o objetivo de permeabilizar o solo e proteger as dunas, mas a polémica estalou com a decisão da autarquia asfaltar com alcatrão o acesso à praia.
Os partidos à esquerda do PS denunciaram o que disseram ser um atentado ambiental e a associação ambiental Zero contestou fortemente a obra. A autarquia respondeu dizendo que tinha luz verde da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) mas esta organização veio esclarecer que “não foi emitido qualquer parecer” e mais tarde chumbou mesmo a pavimentação do caminho.
No mesmo ano, a presidente da autarquia protagonizou outra polémica ao afirmar que os bairros sociais de Almada têm o privilégio de ter uma “vista maravilhosa” e que ela própria se mudaria “amanhã” para um deles. Partidos de esquerda e associações de moradores criticaram as declarações da presidente e afirmaram que esta estava a tentar desvalorizar as graves condições em que vivem milhares de pessoas.
Mas também se agravou a relação entre a autarquia e os seus trabalhadores. Exemplo disso foi, em outubro de 2020, quando a autarca do PS se recusou a receber os representantes do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local (STAL). A câmara pretendia iniciar um processo de desmantelamento do serviço de saúde ocupacional, retirando as especialidades conquistadas pelos trabalhadores remetendo-os exclusivamente para a medicina do trabalho. Para além disso, o executivo camarário quer reduzir o pagamento aos fornecedores dos refeitórios, transferindo os custos para os trabalhadores, e acabando com a sopa gratuita, que em alguns casos significará menos uma refeição por dia. Entre as reivindicações, os trabalhadores contestam a proposta da autarquia de retirar aos seus filhos a creche e jardim de infância por eles construída, passando a incluir este equipamento na rede nacional das IPSS.
Sem espaço para uma reunião de 1700 funcionários, a autarquia propôs uma instalação que dava apenas para 200, mas não era suficiente e o STAL sugeriu que o plenário se realizasse na rua como já tinha sido autorizado pela Câmara Municipal noutras ocasiões, explicou, então, à Voz do Operário Pedro Rebelo, dirigente sindical.
Mas desta vez, a reunião não foi autorizada e os trabalhadores decidiram avançar na mesma para o plenário com desfile rumo à Câmara Municipal. Quando os manifestantes se encontravam junto à Câmara Municipal, Inês de Medeiros tentou interromper o plenário contestando os argumentos dos trabalhadores e tentando oferecer uma reunião cujo pedido se havia negado a responder.
No plano financeiro, a autarquia também não esteve isenta de polémicas. Em abril deste ano, Inês de Medeiros alegou que pediu um empréstimo para fazer face a um conjunto de obras já programadas, conciliando com o “esforço que o município tem de fazer para poder concorrer ao Plano de Recuperação e Resiliência”, noticiou o AbrilAbril. Contudo, no mês anterior, a autarquia tinha entregue à banca 20 milhões de euros com uma taxa de juro de 0%, o que não acontece com o empréstimo que pode custar aos munícipes 200 mil euros, devido à taxa de 0,5%.