Oito anos depois da formação do primeiro governo operário da história com a Comuna de Paris, as mulheres e os homens que defendiam os mesmos princípios e suavam em Lisboa por meia dúzia de tostões na indústria tabaqueira decidiram fazer este jornal.
Cumprem-se 140 anos daquele que é hoje o título operário mais antigo do país em circulação. Como afirmou o sindicalista José Gregório de Almeida, em 1938, A Voz do Operário nasceu “da luta dos trabalhadores das fábricas de tabaco” face ao seu “esmagamento moral e material”, num tempo em que este era um dos setores operários mais “desgraçados”. Porque a imprensa generalista não lhes dava voz, um grupo de trabalhadores mais conscientes percebeu a importância de terem o seu próprio jornal.
O primeiro diretor, Custódio Braz Pacheco, expressou assim a missão deste jornal: “pugnar denodamente pelos interesses materiais e morais da classe que representa; concorrer quanto possível para a educação profissional e moral da classe operária e instrução do povo, defender os que sofrerem injustiças, vexames e violências; promover o desenvolvimento da indústria e do comércio, e trabalhar incessantemente para o bem estar social em harmonia com o presente programa”.
Duas notas a sublinhar, o primeiro número d’A Voz do Operário já expressava uma certa compreensão do valor da solidariedade internacionalista ao afirmar o propósito de “boa camaradagem” com operários tabaqueiros de outros países e já apresentava algum pendor feminista com um artigo de Maria Amália Vaz de Carvalho. Anos mais, tarde, Angelina Vidal encabeçaria este projeto com um papel determinante na redação do jornal.
Se são indiscutíveis os avanços conquistados pela luta de gerações e gerações de trabalhadores também é certo que as razões que nortearam os fundadores d’A Voz do Operário se mantêm vigentes. Fiéis ao compromisso com os trabalhadores e os seus interesses, os diferentes jornalistas e colaboradores que carregaram em ombros o objetivo de conquistar a emancipação social dando voz aos operários através deste jornal assistiram às profundas transformações do panorama mediático e político no nosso país.
Não é por acaso que é no dealbar das mais importantes revoluções do século XX que se dão os processos mais profundos de massificação e democratização dos meios de comunicação social. A Voz do Operário testemunhou a instauração da República e a imprensa operária multiplicou-se como reflexo da efervescência, da força social e da emancipação dos trabalhadores portugueses. A seguir, a revolução que derrubou o fascismo, em 1974, para além do nascimento de centenas de meios impressos, a nacionalização da banca e dos seguros, detentores dos principais meios de comunicação, traduziu-se na democratização das linhas editoriais de órgãos que durante meio século haviam estado amordaçados pela censura fascista. A Voz do Operário que enfrentou a mais longa ditadura da Europa apoiou esse processo.
Um jornal que olha para o futuro
Durante as últimas décadas, às políticas revanchistas de direita que conduziram à privatização da esmagadora maioria dos órgãos de comunicação social sucedeu-se a extinção de dezenas de títulos de imprensa e a concentração de quase todos os meios nas mãos de uns poucos grupos económicos e financeiros. O contexto mediático atual, com as devidas diferenças, é parecido com o vivido pelos operários tabaqueiros que não conseguiam ver retratado nos jornais da época a sua realidade e as suas aspirações.
Num mundo cada vez mais complexo, só a imprensa livre e democrática pode dar resposta ao recrudescimento do fascismo em todas as suas formas fazendo da verdade uma arma e dando voz às lutas de quem trabalha. Ou seja, a esmagadora maioria da população. A Voz do Operário faz parte dessa resistência e procura dar, de acordo com as suas capacidades, aos seus leitores a qualidade, a diversidade e a profundidade do retrato que fazemos de uma realidade cada vez mais exigente.
Chegar mais longe, chegar a mais gente
Abrir as páginas deste jornal é um gesto repetido por muitos milhares há 140 anos. Atualmente, são muitos os que mensalmente recebem o jornal em casa em todo o país e os que o lêem nos diferentes espaços da instituição. Com uma página própria, A Voz do Operário passou a estar disponível também na internet. Para além desta edição digital, o jornal pretende que mais gente se junte a este projeto e caminhe connosco neste trilho iniciado em 1879. Subscrever este jornal não é apenas assinar uma publicação. É apoiar uma ferramenta cada vez mais necessária diante dos perigos que espreitam e é ajudar-nos a sustentar um projeto que deve ter como principal fonte de financiamento os trabalhadores a quem damos voz.