Se não sabe porque é que pergunta? A diversidade em debate (parte2)

Esta questão, título da obra que regista em livro um diálogo entre João dos Santos e João Monteiro, parece-nos ser uma metáfora interessante para explicitar o argumento que vos trazemos. Importa ganhar consciência de que todas as crianças precisam de ver consideradas as suas diferenças e agrupadas com outras crianças com diferentes necessidades e formas de pensar para se poderem enriquecer mutuamente pela diferença.

Neste contexto, os agrupamentos de alunos com o objetivo de os homogeneizar iniciam processos de discriminação que se traduzem na criação de guetos e de processos educativos de primeira versus processos educativos de segunda. A utilização do critério idade para a criação de grupos tem demonstrado largamente a sua ineficiência. Basta olharmos para as estatísticas do insucesso ou, em alternativa, por exemplo, no programa mundialmente conhecido: As novas oportunidades. Ou seja, genericamente a questão é a seguinte: somos conhecidos pela fragilidade dos nossos processos educativos (os primeiros). Porém, não pensamos em como os melhorar. Em vez disso, criamos umas segundas oportunidades que procuram remediar o que não correu bem com as primeiras. Independentemente da bondade, rapidamente se verificou que as novas oportunidades foram associadas a oportunidades para os incapazes que não conseguiram à primeira. Transformámos as segundas oportunidades em oportunidades de segunda. De mansinho assistimos à criação dentro da escola de grupos com carácter temporário que, mais cedo ou mais tarde, levam os elementos que os constituem a apropriar-se da identidade atribuída e a tornarem-se definitivos: os que têm um ritmo de aprendizagem lento, os que estão atrasados, os que vão à frente, etc. O que devia ter sido uma forma de ajuda temporária transforma-se numa forma de organização de trabalho definitiva.

 Com os iguais aprendemos pouco. Encontramos conforto nas certezas e, como Narciso, ficamos seduzidos pelo espelho que o outro se torna. Porém, como a História não se cansa de nos demostrar, rapidamente nos transformamos em inimigos e, pela competição, querermos ser melhor do que os outros.

Na realidade, só o confronto com a diferença pode suscitar o que os psicólogos apelidam de conflito sociocognitivo. Só evoluímos quando temos a necessidades de integrar diferentes perspetivas que nos permitem reconfigurar o pensamento atual e aceder a níveis superiores de complexidade. É fundamental examinar diferentes soluções para os mesmos problemas. Devemos introduzir no nosso sistema de pensamento factos novos introduzidos pelo pensamento dos outros. Para podermos evoluir é necessário confrontar as representações que temos com as representações que os outros têm sobre as mesmas coisas, comparar as nossas formas de aprender com as formas de aprender dos nossos camaradas e perceber nas diferentes formas de abordar as situações, aquilo que têm em comum e de diferente.

Para o desenvolvimento intelectual é fundamental fazermos o exercício de aproximar e integrar os diferentes pontos de vista e de distinguir, progressivamente, o saber do crer, aquilo que são as diferenças fundamentais daquilo que pode ser um ponto de acordo. Um saber onde se articula aquilo que nos é comum e, portanto, todos concordam, daquilo que nos separa, e sublinha as diferenças legítimas e aceitáveis entre diferentes pontos de vista, opiniões e conceções de uns e de outros.

Certo que este conflito não se produz espontaneamente, e muito menos se nasce com uma predisposição genética para o efeito, é necessário um saber profissional e um controlo pedagógico para favorecer o pensamento e as trocas entre os alunos, evitando que a confrontação se torne num conflito de influências que será ganho pela intimidação, imposição e medo de acordo com os estatutos sociais mais ou menos explícitos.

Os professores não se podem abster e deixar que a espontaneidade tome conta das interações. É importante garantir que todos têm a oportunidade de se exprimir e de ser entendidos e que a tarefa/atividade proposta requer necessariamente a intervenção de todos. Assim, com estas condições garantidas, rapidamente nos apercebemos em que ponto é que a intervenção é eficaz: ela permite que os alunos mais frágeis numa determinada atividade se possam desenvolver e, em simultâneo, que os alunos identificados como os que têm aprendizagens mais sólidas encontrem obstáculos na explicitação do conhecimento, o que lhes permite melhorar a sua apropriação. Pois, a melhor maneira de aprender continua a ser a de ensinar. A obrigação de tornar o conhecimento explícito para o outro faz evoluir o pensamento e, assim, consolidar o conhecimento.

Para além da mediação educativa nas interações entre os alunos também a interação entre professor e alunos deve buscar o desenvolvimento do pensamento. Para tal, as interações verbais são fundamentais. Os trabalhos que têm sido feitos nesta área têm demonstrado que os professores dispõem de um conjunto de recursos para suportar o desenvolvimento dos alunos, muito para além das perguntas diretas. Considere-se: o incentivo à realização de inferências a partir de determinados conhecimentos, pedidos de justificação ou clarificação de uma opinião e/ou resposta, a focalização da atenção para um aspeto da tarefa em particular, o pedido de um resumo ou elaboração conceptual, são alguns exemplos de alternativa às perguntas diretas.

Contudo, a realidade é outra. Os trabalhos que têm sido feitos sobre as interações em sala revelam que a fala do professor ocupa entre 80% a 90% do tempo das aulas. E as interações predominantes são as mais pobres: Pergunta do professor, resposta do aluno, avaliação pelo professor e nova pergunta do professor.

Assim, permanece a questão: se a aprendizagem é feita pela negociação de significados através da confrontação de pontos de vista, como é que os alunos aprendem se não podem falar?

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