A entrega da Casa Municipal da Juventude a uma escola de dança de Viseu causa polémica em Almada. A autarquia local celebrou um protocolo com a Companhia Paulo Ribeiro em que é cedido o espaço emblemático para os jovens do concelho, conhecido como Ponto de Encontro, que existe desde 1989 em Cacilhas.
De acordo com o protocolo, a utilização do equipamento é entregue a título gratuito com um apoio municipal acrescido de 120 mil euros anuais com o objetivo de se criar a Casa da Dança de Almada. Em comunicado, a autarquia diz que quer “garantir uma oferta de qualidade ao nível da programação de espetáculos de dança contemporânea e promover o ensino das diferentes modalidades de dança contemporânea e, sobretudo, junto da população mais jovem de lançar novos horizontes e de resgatar talentos”. A Câmara Municipal destaca ainda a “projeção internacional” do coreógrafo e bailarino Paulo Ribeiro, que já foi diretor de várias companhias e estruturas de bailado, como o Teatro Viriato, Ballet Gulbenkian e Companhia Nacional de Bailado (CNB), da qual se demitiu em julho “por decisão pessoal”. A Casa da Dança de Almada deverá apresentar, “no decorrer do ano 2019, o plano estratégico para a implementação efetiva do projeto”, e assegurar duas atuações com produções próprias, apresentar duas coproduções com companhias congéneres, nacionais ou internacionais, promover um acolhimento internacional, parcerias e intercâmbios.
Mas A Voz do Operário sabe que a decisão não é consensual em Almada. O protocolo recebeu a oposição dos eleitos da CDU no executivo e de um grupo de cidadãos que contesta o protocolo que cede um equipamento municipal que continua a ser um espaço de trabalho para muitos artistas e associações. A coreógrafa Cláudia Dias contesta a decisão e afirma que não se pode substituir um projeto histórico de fruição e criação cultural de todos por um projeto de uma pessoa. “É um ato de exclusão”, afirma. Nega que o Ponto de Encontro esteja morto como alega a autarquia e diz que esta casa “foi um incubadora de atores, músicos, bailarinos e fotógrafos que antes de serem profissionais por ali passaram”. Para Cláudia Dias, “as pessoas deixam de ter uma ferramenta de criação livre. Se houvesse respeito pelas companhias profissionais, pelos grupos do concelho e pelo movimento associativo e viesse outra estrutura era uma coisa mas quando há um ataque ao movimento associativo, desrespeito pelas companhias de dança e teatro já existentes isto quer dizer outra coisa”. Cortam-se apoios e subsídios às associações locais e investe-se num projeto externo, considera a coreógrafa que aponta razões ideológicas para a forma como se tratam os agentes locais.
Um dos almadenses que testemunhou a criação do Ponto de Encontro, recorda que era “o quartel general dos jovens rebeldes, os criativos da região. Aqui dezenas de bandas de todos os tipos se juntavam, criavam laços inter-tribais, ensaiavam, davam concertos. Aqui se fazia a Feira do Metal. Aqui se fazia a Feira Mundial do Fanzine. Aqui se apresentavam performances multimédia. E bailado contemporâneo. E sessões de vídeo. E a BD dos 4 magníficos do Hips”, escreveu Miguel Paulitos nas redes sociais. O texto contesta a decisão da autarquia de que diz só conhecer de Almada o Cristo Rei. “Mais 120.000 biscas anuais. Se pensam que vamos assistir a isso passivamente bem podem escolher uma poltrona confortável e esperar sentados”.