Opinião

Paz

Olá às armas

Onde, num passado recente, se falava na necessidade de contenção financeira na melhoria das condições de vida dos europeus, anunciam-se agora quantias avultadas para a velha corrida ao armamento.

António Guerreiro, em “Acção Paralela”, referia que a palavra distopia tinha conseguido saltar a fronteira do jargão técnico-literário para a linguagem corrente, onde antes seria mais fácil encontrar a palavra utopia. Um caminho feito por roteiros de Hollywood no seu papel dessensibilizador da violência e do romance do fim do capitalismo em grande catástrofe, sem vislumbrar a existência de alguma alternativa ou de qualquer superação de um caminho de auto-aniquilação para além do heroi mais ou menos idiossincrático.

Nos pequenos ecrans, e de forma diária, vemos reflexos constantes de narrativas de destruição, convenientemente sustentadas com o perigo do outro e a necessidade de defesa na preservação de valores próprios, aparentemente exclusivos do lado de cá. Onde, num passado recente, se falava na necessidade de contenção financeira na melhoria das condições de vida dos europeus, anunciam-se agora quantias avultadas para a velha corrida ao armamento.

No horizonte, outrora utópico, a palavra guerra prefixa todas as ideias do nosso futuro colectivo de forma tão natural como a aspiração das populações a uma vida digna, que começaria na liberdade e na paz. A violência dos conflitos que decorrem é tal forma bárbara que remete a convenção dos direitos humanos a letra morta e a ONU à irrelevância já há muito planeada.

Não nos iludamos, nem nos deixemos enganar. À nossa corrida às armas outras corridas se oporão. Cada bala fabricada tem como alvo a carne de um semelhante. Cada bomba armazenada aguarda a destruição cega de uma construção colectiva. Quanto mais armas fabricadas, mais longas e sangrentas as guerras, ou maiores os paióis cheios de desperdício. O negócio da guerra não traz nenhum benefício económico para as populações. O seu resultado líquido não nutre de cultura as nossas mentes, não edifica as nossas casas, escolas ou hospitais e não serve de pão. Tampouco nos serve de defesa, serão os trabalhadores que constroem as armas que as envergarão e que com elas caminharão rumo ao memorial do soldado desconhecido. No lugar de uma força de trabalho dedicada a um sonho colectivo, teremos desertos de escombros fumegantes como campas de cadáveres desconhecidos. Na vez de uma geração que cresce na paz, teremos jovens marcados pelos horrores da guerra.

Não há verba excedente o suficiente para se entregar à guerra que não seja necessária a um projecto social mais amplo. E, como se vê, não há nenhuma paz fértil e duradoura construída sobre um monte de bombas prontas a explodir. A direita, que surge agora com promessas de acabar com as guerras, alimenta conflitos e genocídios camuflados sob a desestabilização da economia global.

Pouco ou nada surge do nada, superadas as crises das dívidas soberanas, e depois a sanitária, o capital continua, e continuará enquanto o permitirmos, a gerar crises das suas contradições na impossibilidade de gerar bem-estar a todos respeitando o ecossistema que nos rodeia. Aos povos nada mais serve do que o fim da guerra; o desarmamento incondicional mundial; a dissolução dos blocos e alianças bélicas. Recordar as aspirações de um internacionalismo baseado no progresso e desenvolvimento comuns, construído na paz.

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