Atualmente, a sociedade reconhece a infância como um período da vida de especial vulnerabilidade que deve ser especialmente cuidado e protegido, foi por essa razão que em 1959 foi proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a Declaração dos Direitos da Criança que reconhece, entre outros, os direitos das crianças à educação, à brincadeira, a um ambiente favorável e a cuidados de saúde. Em 1989 a Convenção sobre os Direitos das Crianças foi aprovada na Assembleia Geral das Nações Unidas, consistindo no primeiro instrumento de direito internacional a conceder força jurídica internacional aos direitos da criança, aclamada como uma conquista histórica dos direitos humanos, reconhecendo às crianças papéis sociais, económicos, políticos, civis e culturais. A Convenção sobre os Direitos das Crianças foi, entretanto, ratificada por todos os países, com a excepção dos Estados Unidos da América que, até aos dias de hoje, alegam criar conflitos com as políticas nacionais no tocante aos pais, soberania, Estado e legislação local.
Em Portugal, os direitos da infância e da juventude estão consagrados na Constituição da República Portuguesa (CRP), nos artigos 69º e 70º.
Infelizmente, para muitas crianças em Portugal os seus direitos não passam de bonitas intenções.
A felicidade, tão bem explicada pelas crianças, está intimamente ligada com um modelo social que privilegia a compatibilização da vida familiar com o trabalho (CRP, artigo 67º), para que pais e filhos possam brincar e sonhar juntos. Está intimamente ligada a um modelo social que privilegia a vida coletiva e combate o individualismo, que concebe o direito à educação pensado para cada criança e para todas as crianças (CRP, artigos 43º e 74º), que vê a habitação adequada para cada família como um direito efetivo e inalienável (CRP, artigo 65º), que privilegia o espaço público pensado para as pessoas (CRP, artigos 78º e 79º), que privilegia o acesso à saúde de qualidade para todos (CRP, artigo 64º), o modelo ao qual a revolução de Abril abriu portas. Abril, sonhado coletivamente por tantos, assenta na redistribuição da riqueza em vez da sua acumulação. Lamentavelmente, para muitas crianças, são cada vez mais as famílias com horários e ritmos de trabalho severos, trabalho por turnos e aos fins-de-semana, imposto em sectores onde ele é desnecessário e cuja solução apresentada é abrir creches e jardins-de-infância 24h/24h submetendo ainda mais famílias ao trabalho por turnos, propondo o ciclo infindável de exploração, destruidor do direito ao tempo coletivo.
Carlos Neto tem alertado para a urgência das crianças brincarem e serem ativas e para os riscos para a saúde mental trazido pela clausura das paredes e dos ecrãs. Este apelo à urgência da vivência de exploração do espaço coletivo, de brincadeira, de desafio, de criatividade não é possível ser concretizada sem tempo para o ócio. Por estas razões, lutar pelos direitos do trabalho, da habitação, do direito à saúde, à educação, à cultura, é lutar pelo direito das crianças verem os seus direitos concretizados. Cada direito conquistado pelos trabalhadores é um direito coletivo conquistado, com amplo impacto na forma como nos organizamos socialmente. A revolução de Abril foi o maior garante dos direitos das crianças em Portugal que viram nascer o seu direito à educação, ao fim do trabalho infantil, à saúde, à habitação digna, a brincar e a ser feliz. Em 2024, cinquenta anos depois do dia um da revolução de Abril as crianças confrontam-se com a urgência de a defenderem.
É impossível escrever sobre os direitos das crianças sem salientar as crianças Palestinianas, que são as maiores vítimas do massacre perpetrado por Israel ao povo Palestiniano, apoiado pelos Estados Unidos da América, único país do mundo que não ratificou a Convenção dos Direitos das Crianças.
Mas é nas mãos das crianças que cabe o sonho, como disse João dos Santos o segredo do Homem é a própria infância, é com as crianças que reside a construção do futuro de esperança onde o sonho é transformador da realidade.