Eleito há cerca de sete meses (a 19 de dezembro de 2021) como candidato do Aprovo Dignidade, uma frente de esquerda que integra o Partido Comunista, o jovem Presidente chileno, Gabriel Boric enfrenta, dentro de aproximadamente um mês, um novo desafio.
Os cerca de 15 milhares de eleitores vão aprovar ou rejeitar o novo texto constitucional, apresentado pela Convenção Constitucional, consagrando um conjunto de princípios e garantindo direitos que permitem a transformação política, económica e social do Chile, país marcado pela política neoliberal que foi encetada depois do Golpe de Estado apoiado pelos EUA, que a 11 de setembro de 1973 levou ao poder o ditador Augusto Pinochet, a morte do seu presidente eleito democraticamente, Salvador Allende e a perseguição e morte de milhares de opositores.
Neste plesbicito, em que o voto é obrigatório e a multa elevada, os eleitores vão poder aprovar um texto que consagra direitos. Fica assim prevista a proibição de qualquer forma de discriminação por motivos de “nacionalidade ou apátrida, idade, sexo, características sexuais, orientação sexual ou afetiva, identidade e expressão de género, diversidade corporal, religião ou crença, raça, associação a povos e nações indígenas ou tribais, opiniões políticas ou outras, classe social, ruralidade, situação migratória ou refugiada, deficiência, condição de saúde física ou mental, estado civil, afiliação ou status social, e qualquer outro que tenha por objeto ou resultado anular ou prejudicar a dignidade humana, o gozo e o exercício dos direitos”.
Num debate organizado pela televisão chilena EMOL um conjunto de especialistas e académicos têm vindo a traduzir e a debater o texto constitucional referindo, por exemplo, a consagração de direitos aos “povos e nações indígenas e seus membros, em virtude de sua autodeterminação”, consagrando o “pleno exercício de seus direitos coletivos e individuais”, e o reconhecimento e garante por parte do Estado do “direito dos povos e nações indígenas às suas terras, territórios e recursos”.
Mas também o direito à “liberdade de pensamento, consciência, religião e visão de mundo” e também o direito de associação.
“Na saúde, o texto constitucional proposto aos chilenos defende um “Sistema Nacional de Saúde universal de caráter público e integrado”.
No plano social o texto constitucional garante a segurança social, “com base nos princípios de universalidade, solidariedade, integralidade, unidade, igualdade, suficiência, participação, sustentabilidade e oportunidade” e o princípio de salário igual a trabalho igual, bem como o direito dos trabalhadores a “uma remuneração equitativa, justa e suficiente, que assegure sua subsistência e a de suas famílias”, o direito à greve e à sindicalização.
Na saúde, o texto constitucional proposto aos chilenos defende um “Sistema Nacional de Saúde universal de caráter público e integrado”.
Também a Constituição passa a assegurar o direito a uma proteção especial aos animais por parte do Estado reconhecendo sua “senciência e o direito de viver uma vida livre de abusos”.
A ser aprovado a 4 de setembro, pelos eleitores o texto constitucional, os chilenos começam a fechar o ciclo que se iniciou com os protestos de 2019, a eleição de Gabriel Boric no final de 2021 e que manda definitivamente para a história mais negra do país a política neoliberal que se iniciou em 11 de setembro de 1971 e que foi traduzido no filme/documentário dirigido por Hélvio Sotto, “Chove em Santiago”, num momento em que a desestabilização no Chile promovida pelos EUA, conduziu à implantação de um conjunto de ditaduras (Brasil, Bolívia Paraguai, Uruguai, Argentina, Chile), de economia neoliberal. Era o tempo da Operação Condor, de perseguição e morte de dirigentes da oposição às ditaduras em todas a América Latina.
Agora, numa altura em que no Perú o sindicalista Pedro Castillo assumiu a presidência, Xiomara Castro foi eleita nas Honduras, Daniel Ortega voltou a vencer na Nicarágua, o Partido Socialista Unido da Venezuela vence em 45% dos municípios, Movimiento al Socialismo vence na Bolívia, Gustavo Petro vence na Colômbia e no Brasil se prepara o regresso de Lula, é caso para dizer que se o texto constitucional for aprovado no Chile, o Sol voltará a brilhar em Santiago.